segunda-feira, 18 de outubro de 2010

LONDON RIVER DE RACHID BOUCHAREB








LONDON RIVER - França/Argélia/Reino Unido, 2009
ELENCO: ELISABETH SOMMERS – BRENDA BLETHYN
OUSMANE - SOTIGUI KOUYATÉ (Premiado no festival de Berlim)

O diretor franco-argelino de >Dias de Glória < (premiado pelo elenco masculino em 2006) mostra com muita segurança e veracidade o preconceito sofrido por imigrantes muçulmanos na Inglaterra e as conseqüências de atentados terroristas para as famílias estrangeiras e inglesas, que perdem seus entes queridos. Mesmo com compaixão, muitas vezes armamos verdadeiras redes de proteção para nos resguardar emocionalmente diante de dramas chocantes, quer seja em desastres naturais ou em atentados terroristas tão freqüentes nesta última década. Neste novo trabalho, Rachid explora a série de atentados ocorridos em Londres, em julho de 2005. O filme se desenrola a partir da fazenda da viúva Elizabeth Sommers que, sozinha, cuida de sua propriedade à beira mar. Sua jovem filha mora em Londres há dois anos e o contacto entre as duas não é muito assíduo, como regra geral na Europa. Pessoas moram sozinhas e não têm muita informação do que se passa com os familiares que se espalham pelo continente. Depois de trabalhar na terra, Mrs. Sommers, já dentro de casa e assistindo televisão, é surpreendida pelas cenas do atentado ao metrô e um ônibus que aconteceram em Londres. Assustada telefona para Jane, mas apesar de vários recados não tem retorno de nenhum deles. Desesperada parte para Londres e, agora sim, começa sua brilhante atuação. Deparando-se em um bairro de árabes onde mora sua filha, seus trejeitos, um misto de superioridade étnica e nojo, ao se aproximar dessas pessoas são bastante convincentes, pois mal consegue acreditar que ela possa conviver entre eles. Ao mesmo tempo o premiado Sotigui Kouyaté, com sua silueta alta, magra e majestosa de africano digno, vai se aproximando cada vez mais dessa senhora inglesa. Ele trabalha na França há 15 anos, como guarda florestal e não vê o filho desde que emigrara. Não o reconheceria mais. O jovem, criado pela mãe na África, fora para Londres a fim de estudar. Ousmane também se encaminha para lá, a fim de localizar o filho, do qual tem apenas uma foto com outros jovens, na mesquita que freqüenta. Rachid faz questão de mostrar a solidariedade e polidez que reina nesse núcleo segregado. Os dois pais acabam se encontrando, pois os filhos eram namorados, para horror de Elizabeth que vê a possibilidade de Jane ter-se tornado muçulmana. A sequência da história desenvolve-se na aceitação desses personagens tão diferentes socialmente e tão parecidos na dor que guardam. O filme encanta pela narrativa incomum e pelas interpretações de seus protagonistas, principalmente deste ator malinês, que no papel de muçulmano convicto, encara as vicissitudes da vida com uma compostura impecável. Suas expressões são tênues e ao mesmo tempo muito profundas. Sotigui morreu em abril, aos 73 anos. Talvez seja um dos melhores filmes do ano.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

TROPA DE ELITE 2 DE JOSÉ PADILHA

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BRASIL (2010) 118 MINUTOS
Elenco:
Wagner Moura – coronel Nascimento
Irandhir Santos – Fraga (professsor)
André Ramiro – capitão André Matias
Maria Ribeiro – Rosane (ex-esposa de Nascimento)

Esse drama é um “filme denúncia” do que ocorre no momento, já, na Polícia Federal, nos governos estaduais e em Brasília. Deve ter demandado muita investigação, coragem e determinação do diretor, produtor, roteirista e artistas para realizarem um filme tão realista. Não fosse o som prejudicado nas narrativas em off do coronel Nascimento seria genial. É uma história bombástica, que não passará em vão. Ou se concorda ou se discorda, dependendo de suas convicções políticas e dos valores que o formaram ao longo de sua vida. No primeiro Tropa de Elite, premiado com o Urso de Ouro, Padilha debruçou-se sobre o tráfico de drogas, os traficantes e seus braços com a polícia. Seu herói era o jovem Nascimento, capitão do Bope, que agora será promovido a tenente-coronel e, continuando em sua meta de máxima honestidade consigo mesmo, ameaçará as milícias do Rio de Janeiro, engendradas na polícia e na política e com o próprio governador do estado. Esse é um cargo mais burocrático com um homem mais grisalho e desiludido. Seu casamento acabou e seu filho está sendo criado pela mãe e um professor de esquerda (Fraga), protetor dos Diretos Humanos e a favor da reabilitação carcerária. O menino vê-se indeciso com a diferença de atuação dos dois “pais”, que afinal são a favor da lei. As primeiras cenas passam-se no presídio Bangu 1, e pelo rádio Nascimento comanda a tropa de choque que irá seguir suas ordens na tentativa de dizimar uma rebelião de facções criminosas dentro da própria cadeia, que controlavam o tráfico de drogas, pagando pesadas quantias aos chefes das ditas milícias policiais, truculentas ao máximo, uma cópia fiel das máfias. Ele continua muito ligado aos policias do Bope, resguardando que não seja contaminado por policiais corruptos. Contudo, por um erro, a operação não dá certo e seu subordinado preferido, capitão Padilha (André Ramiro) é acusado pela morte de um preso, durante o ofensiva. Seu comandante, assumindo toda responsabilidade, é afastado do Bope e passa a trabalhar na Secretaria de Segurança do Rio de Janeiro. O enredo é complexo exigindo bastante atenção de quem assiste a esse trabalho. Agora o Bope está mais bem equipado, graças ao novo tenente-coronel, Nascimento, contando com mais aparelhamentos e helicópteros. As cenas que veremos durante toda a exibição são de alta adrenalina, “grudando” o espectador na cadeira. Sandro Rocha, interpretando muito bem o major Rocha, é o que há de mais execrável nesse grupo, tendo vários canais que o ajudam. Esses fatos e personagens, na realidade existem ou existiram, contudo têm seus nomes preservados. As sequências de delitos e corrupção viram lugar comum e o excelente Wagner Moura vê-se em um círculo sem saída, demonstrando um envelhecimento precoce de um personagem direcionado para seu interior e sua consciência. É um trabalho magnífico de atuação e direção. Em meio à luta armada entre as milícias e o Bope, Nascimento vê sua vida privada sendo convulsionada, pois seu filho passa a afastar-se dele e a alinhar-se mais com o padrasto, que requisita sua ajuda e seu trabalho. A ex-mulher está apavorada com o encaminhamento das coisas e roga para que se defenda e procure seu filho adolescente. Quando se imagina que todo o controle está perdido, os dois oponentes unem-se pela mesma causa. Fraga, agora deputado estadual, poderá ser de grande valia, abrindo a CPI das milícias, em 2008, o que realmente aconteceu. No final do filme assistimos uma imagem aérea de Brasília, mostrando o Palácio do Planalto e os poderes legislativo e executivo. Se aí está o problema de segurança do Brasil, só daí poderá vir a solução, através dos votos conscientes da população que deveria politizar-se mais. Esse filme promete salas bem lotadas!

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

O SOL DO MEIO DIA DE ELIANE CAFFÉ






BRASIL /2009 (106 MINUTOS)

ELENCO:
Luiz Carlos Vasconcelos – Artur
Chico Diaz – Matuim
Cláudia Assunção – Ciara
Participação de Ari Fontoura como pai de Ciara

Ótimo drama dirigido por Eliane Caffé, cineasta paulistana que dirigiu o premiado Narradores de Javé (2003). O filme se passa no norte do Brasil, nas barrancas de um rio amazônico do estado do Pará. Esse é um trabalho introspectivo, com poucas falas, imagens em close nos principais atores e uma grande carga de dramaticidade nos semblantes dos personagens. Em entrevista a um repórter a diretora diz ter-se inspirado em Crime e Castigo de Dostoievski, que como nesse enredo, discorre sobre assassinato e busca de redenção. Nas primeiras cenas vemos Artur saindo da cadeia, sem uma explicação. Logo surge o ótimo e cabeludo Chico Dias em uma transa com uma bela mulher. Parece um personagem forte como Artur, que irão ter o destino ligado, quando ambos decidem fugir do local onde vivem para subir o rio até Belém. Artur matara sua mulher e é atormentado pelo crime, procurando uma expiação para o delito que não consegue esquecer por ter uma índole honesta e forte. Matuim é seu oposto, uma personalidade inacabada, indecente e patética. Com sua magnífica interpretação torna-se ainda mais ridículo por usar uma peruca, que lhe daria uma força e beleza que não tem. É um homem rústico do norte brasileiro. Esses dois estranhos navegam, em fuga, na velha embarcação de Matuim, quando podemos observar o mangue e sua vegetação de uma grande beleza grosseira devido ao tamanho descomunal das raízes e troncos. Quando a noite cai é aterrorizante, pois o negro absoluto impera e você fica a mercê do que estiver por perto. Eliane explora muito bem as dificuldades de se morar nessas regiões inóspitas. Os homens precisam ter a rusticidade e o instinto animal para perseverar em tais condições. Após um incidente, o roubo do barco, os dois protagonistas são forçados a caminhar por terra, quando, em um vilarejo sem qualquer recurso urbano, encontram Ciara, mulher forte e bela que tenta tirar a filha adolescente da prostituição, tendo também um filho com problemas mentais. Artur se encanta por ela e é correspondido, mas Matuim, sem poder ver um rabo de saia, também a quer, formando um triângulo amoroso. Os homens se afastam procurando trabalho, mas Chico tem a sorte de reencontrar Ciara. Nesses vilarejos perdidos desse Brasil profundo e selvagem, a população tem um mínimo de diversão e cultura sendo a cachaça, o forró e o sexo as únicas alternativas de sociabilidade. Ciara quer um homem sério e másculo como Artur para parceiro e ela, por sua vez, o faz lembrar sua mulher. A ajuda entre eles é silenciosa, contudo palpável. Ocorre que Matuim não se conforma com isso e tenta seduzi-la sem sucesso. No terço final, uma cena com Chico Diaz, desejando uma parceira, rouba o filme. Ele quer conquistá-la de qualquer modo e sua peruca, que escondia uma careca feia e mal tratada, cai, expondo sua verdadeira face – de homem sem cultura, pele e caráter embrutecidos pelo clima e sofrimento. Nesse momento, quando pede que ela o olhe nos olhos e veja com é, sente um denso amargor pela vida. O desempenho desses três personagens é excelente, carregado de verdade e reflexão. A introdução do personagem de Ciara dá mais humanidade e compasso à obra. Os outros atores são quase todos paraenses, como desejou Eliane Caffé, a fim de dar mais veracidade às filmagens. Programão.