terça-feira, 27 de março de 2012

RAUL SEIXAS: O INÍCIO, O FIM E O MEIO DE WALTER CARVALHO.







BRASIL/2011, 115 MIN, DOCUMENTÁRIO.
Walter Carvalho foi muito feliz na execução desse documentário sobre o Maluco Beleza, Raul Seixas. Rauuuull, como um uivo, a metamorfose ambulante. Relembrando sua vida desde a infância no estado da Bahia, quando já queria ser roqueiro, usando sempre a gola levantada, topete e um ar de Elvis Presley, seu ídolo de infância e juventude. Gostava também do baião de Luiz Gonzaga, inspirando-se nesses dois grandes músicos, afinal tão diferentes, mas que para ele tinham a mesma linguagem. O documentário passa por todas as fases de sua vida até sua morte prematura. Subversivo, criava suas músicas desde cedo, com ajuda de amigos e vizinhos. Mais tarde ganha a companhia de Paulo Coelho a quem vai procurar. Formam uma parceria, moram juntos, brigam, compõem e vão levando a vida. Começou a fumar aos 12 anos e a beber aos 15, até se tornar um alcóolatra. Paulo o iniciou no mundo das drogas, todas, como fala no documentário, mas não se sente responsável por seu destino, uma vez que ele já era casado e tinha 26 anos. Depoimentos de várias personalidades como Cláudio Roberto, Plínio Seixas, Carlos Motta, Pedro Bial e suas ex-mulheres, filhas e neto, só fazem enriquecer esse filme que o mostra em todas as facetas humanas – alegre, carinhoso, colérico, drogado e principalmente como artista eclético que foi.

segunda-feira, 26 de março de 2012

PINA DE WIM WENDERS














PINA, ALEMANHA – FRANÇA – REINO UNIDO/2010 DOCUMENTÁRIO, 106 MIN.
Amigo da famosa coreógrafa alemã Pina Bausch, Wim Wenders realiza um espetacular trabalho documental em 3D, após a morte da bailarina em 2009, aos 68 anos. A frase dita por ela, no início do filme, é lembrada até o fim do espetáculo: Não estou nem um pouco interessada em COMO meus dançarinos se movem. Estou interessada NO QUE os move. Não é um documentário sobre sua vida, mas sobre seus principais trabalhos com comentários de seus discípulos que a homenageiam com poucas palavras. A dança, com técnica e desempenho perfeitos e incríveis, é realizada no palco, em salas abandonadas, pelas ruas e em diversos lugares ao ar livre da cidade industrial de Wuppertal. Até mesmo um bonde suspenso e escada rolante servem de cenário. As peças eleitas são A Sagração de Primavera, Café Müller, Vollmond, Kontakthof e várias músicas populares belíssimas. Quase sempre os bailarinos estão descalços, dançando sobre a terra espalhada sobre o tablado, ou ainda, calçados com sapatos convencionais ou com sapatilhas quase transparentes. Os vestidos são sempre languidos, esvoaçantes e com alças finas que sempre saem do lugar a fim de teatralizar melhor as situações. Os homens usam calças, ternos e às vezes chapéus. Existem movimentos repetitivos, quase robóticos, enfatizando o deslocar dos membros, primeiro vagarosamente, até que a velocidade seja tão grande que os faça cair em estado de stress total. As danças nas ruas e em cima de pedras, com a água compondo um fundo musical, também são de tirar o fôlego. Uma grata surpresa é ver nosso Caetano Veloso sendo homenageado com sua canção Leãozinho. Dentre os dançarinos que prestam seus depoimentos, outra brasileira, Regina, apresenta uma performance de grande leveza e perfeição movendo-se sobre encostos de simples cadeiras expostas ao ar livre, sobre a grama. A câmera movimenta-se para vários lados, mostrando os bailarinos ao longe ou perto, em meio a eles, e a sensação é de estarmos todos juntos. A técnica de terceira dimensão foi essencial para o absoluto sucesso dessa obra prima. Pina aparece muito pouco, mas sua obra é sobejamente exaltada. Programa imperdível para qualquer público. O filme foi realizado graças aos pedidos da família e do elenco dessa companhia global, uma vez que são provenientes dos mais diferentes países, fundada por ela em 1973, o Tanztheater Wuppertal.

terça-feira, 20 de março de 2012

HABEMUS PAPAM DE NANNI MORETTI
















HAVEMUS PAPAM, ITÁLIA-FRANÇA/2011, 102 MIN. comédia dramática
ELENCO:
NANI MORETTI – PSIQUIATRA
MICHEL PICOLLI – PAPA
MARGHERITA BUY
Nomeado à Palma de Ouro, em 2011, no Festival de Cannes, essa mistura de drama e comédia foi uma excelente oportunidade para que esse talentoso diretor e roteirista italiano falasse sobre problemas tão atuais: poder e competência. O poder é objeto de desejo da maioria das pessoas na atualidade, mas as reponsabilidades e os desafios que o acompanham são, na maioria das vezes, desastrosos, visto que a ambição humana é cada vez maior e insaciável. Nessa deliciosa comédia, o papa morre e um conclave ocorre para que se eleja o novo papa. Tudo isso mostrando a beleza, a riqueza dos rituais da igreja católica e a seriedade da escolha. A Praça São Pedro encontra-se repleta de fiéis e jornalistas, mas fora dos muros do Vaticano as notícias são vetadas. Os candidatos dos mais diversos continentes estão ansiosos e ao mesmo tempo alarmados pela deliberação final. Essas são uma das melhores cenas do filme. Finalmente os jornalistas com suas câmeras apontadas para a fumaça negra e para a sacada principal, observam que a queima dos votos cessara. Habemus Papam. O doce e tímido cardeal Melville, representado maravilhosamente pelo idoso e espetacular ator Michel , é escolhido como o novo representante de Deus. Aturdido vai em direção à sacada, onde anunciam sua posse, mas tomado por uma crise psicológica gravíssima diante de tal responsabilidade só consegue expressar um horrível grito de desespero e não aparece para saudar o povo. Acha-se indigno e inadequado para tal posição, pedindo ajuda para seus pares. A solução encontrada é chamar o melhor psiquiatra e professor da Itália, o próprio Moretti nesse papel, para resolver sua crise de identidade. Esse artifício mostra-se inadequado, uma vez que todos estariam em volta do santo homem e a maioria das perguntas é considerada imprópria. Moretti revela que sua mulher, também psiquiatra, era ótima profissional e tinha uma tese em que a criança que teria sido negligenciada durante os seis primeiros meses de vida seguiria por toda a existência com essa sequela inconsciente. Esses fatos são hilários, pois desde a cobrança das consultas até as origens da vida de Melville não poderão ser analisadas e não se chegará a qualquer conclusão. Picolli (Melville) desaparece e tenta viver da maneira mais humana possível para se encontrar. Aos poucos, consegue enxergar seus problemas mais íntimos e seus desejos não realizados. Com isso veremos as redondezas do Vaticano, como a mídia trata o caso e o contato anônimo com seu povo. O final é bastante original e nos dá a medida certa da importância de cada pessoa e de suas possibilidades ou impossibilidades.

segunda-feira, 19 de março de 2012

SHAME DE STEVE MCQUEEN












SHAME, REINO UNIDO/2011, 101 MIN. DRAMA.
ELENCO:
MICHAEL FASBENDER – BRANDON
CAREY MULLIGAN – SISSY
JAMES BADGE DALE
Dirigido por Steve McQueen, ótimo artista plástico inglês e diretor do filme Hunger, o talentoso e corajoso ator Michael Fassbender, nascido na Alemanha e criado na católica Irlanda, tem um excelente papel nessa obra. O filme foi premiado durante todo o ano de 2011, mas sem indicação ao Oscar. Brandon, interpretado com total COMPROMETIMENTO por Fassbender, é um executivo de uma pequena firma de informática. Ganhando bem, vestindo-se bem e morando em um apartamento confortável ele não é totalmente feliz. Viciado em sexo, tem todos os obstáculos de qualquer dependência química. Quanto mais se debruça sobre seu vício, mais condicionado fica, até que se torne insuportável. Contido e bem educado vai garantindo sua depravação, entretanto isso não passa despercebido em seu trabalho, onde tem seu computador sequestrado por conter inúmeras imagens pornográficas e também por ser invejado pelo chefe. Condutor de uma vida organizada a seu modo, tem a surpresa de receber a irmã Sissy para passar um tempo em seu apartamento em Manhattan, mostrada como uma cidade onde o sexo vibra a cada esquina. Ela é uma jovem cantora incontida sexualmente, carente de atenção e tendências suicidas. Isso se reflete como um espelho distorcido para Brandon, pois passa a encarar suas deficiências de maneira ainda mais densa. Ele não tem e não quer ter nenhum vínculo afetivo com qualquer mulher, principalmente sua irmã. A única vez que demonstra algum afeto por ela é quando a ouve cantar New York, New York, em uma soberba apresentação, fazendo com que ambos se reportem a seus sonhos de liberdade e sucesso. Os acontecimentos nefastos causados pelo convívio entre os irmãos vão a tal clímax, que o espelho distorcido se parte mostrando o que sobrou afinal das contas – Vergonha. O nome do título em inglês. A cena final é primorosa. Brilhante apresentação de Carrey Mulligan (Sissy).

segunda-feira, 12 de março de 2012

CAIRO 678 DE MOHAMED GIAB











678, EGITO, 2010, DRAMA, 100 MIN.
ELENCO:
BOSHRA
NELLY KARIM
MAGED EL KEDWANY
O filme é dirigido por Moramed Giab, um dos novos nomes de diretores do Egito. Peça quase documental, descrevendo e denunciando o lugar da mulher moderna, em uma nação que as trata como objetos. Refere-se à sina de três delas, duas ricas e independentes e uma verdadeira representante da classe média egípcia e mulçumana. É pesado, trazendo muita revolta e angústia para as mulheres do ocidente. Inicia-se com cenas das mãos de uma rica joalheria e artesã, fazendo um casal de bonecos dançando amorosamente. Trata-se de um pingente muito procurado. Essa jovem é casada com um médico esclarecido e o casamento parece muito feliz. Eles vão a um jogo de futebol e o marido incita a mulher a torcer pelo Egito como uma verdadeira egípcia. Uma imposição. No portão de saída, lotado de homens, ela se separa do marido sendo arrastada, cercada por brutamontes e estuprada. Estava no início de uma gravidez, mas o marido não consegue mais olhá-la, a não ser com desprezo pelo ocorrido. Precisava de um tempo para se recompor. Passa a viver sozinha e, assim, ministra um curso de defesa para mulheres que sofrem de assédio sexual, ato corriqueiro naquela sociedade. Em vão, todas as folhas com perguntas são devolvidas em branco pelas alunas. Em outras cenas vemos a jovem muçulmana convicta, coberta da cabeça aos pés, mãe de dois filhos e casada, que ao pegar o ônibus a fim de trabalhar, é sempre assediada por homens. Eles se encostam às mulheres e se desfrutam, sem serem repreendidos nem por elas nem por ninguém. Desesperada e traumatizada não quer mais saber do marido e demonstra isso claramente. Resolvendo ir ao curso, tímida ouve as instruções e no fim da aula a professora lhe chama e diz que elas deveriam se rebelar e se defender. É o que faz, mais uma vez molestada, pega o alfinete que segura seu véu, enfia-o profundamente na mão do agressor, dentro do veículo lotado. Isso causa uma prontidão, mas ele não diz o que se passou. Numa segunda vez defende-se com um canivete e o caso acaba indo parar na mídia. Outra jovem, noiva, que quer ser humorista, também é assediada quando atravessa uma larga avenida, mas esse caso não fica em aberto. Eles vão parar na polícia, que faz de tudo para não registrar o ocorrido. Aí estão três situações diversas, mas com reações explícitas das mulheres. O desenrolar do filme é muito interessante, pois mostra as atitudes femininas e masculinas a tais fatos. Serão cenas desconcertantes e até frustrantes, mas, finalmente, depois de um ano, em 1999, o assédio é considerado crime no país. 678 é o numero do processo instalado. Entretanto até hoje são raros os casos de denúncia. Imperdível. Ótima atuação das atrizes e as histórias são reais.