segunda-feira, 31 de agosto de 2015

HOMEM IRRACIONAL DE WOODY ALLEN






IRRATIONAL MAN, EUA, 2015, 95 MIN. DRAMA
ELENCO:
EMMA STONE – ESTUDANTE JILL
JOAQUIN PHOENIX – ABE LUCAS
PARKER POSEY – PROFESSORA RITA

Só mesmo Woody Allen poderia filmar esse drama com humor e suspense, sendo seu 46° filme. Sempre obcecado por assuntos psicológicos, filosóficos, assassinatos perfeitos o diretor, claro, é amante dos bons escritores russos e compartilharemos como inspiração “Crime e Castigo” de Dostoievsky. Abe Lucas é um famoso professor de filosofia, que no momento passa por um grave momento de depressão e resolve dar aulas em outra universidade, no interior dos Estados Unidos. Muito bem recebido, pois sua fama o precedia, é aguardado com entusiasmo, principalmente pelas alunas e professoras. Abe está sempre um pouco fora de sintonia pela bebida que ingere pesadamente, sendo considerado alcoólatra. Entretanto suas aulas são muito esperadas pelos alunos que gostam de sua maneira de encarar a vida, discorrer sobre assuntos pesados como existencialismo, citando Freud, Kant e Heiddeger. Sua especialidade é Kirkegaard (doença da morte). Simplifica bem os temas filosóficos com exemplos cotidianos e acentua o livre-arbítrio. Desde a chegada uma professora o persegue e uma aluna, Jill, a atual musa do diretor Emma Stone, que, apesar de noiva, se apaixona por ele. Elas não são fáceis de lidar e o disputam. Não dá nenhuma esperança a ambas, pois está até sem vida sexual. Furtivamente, em uma lanchonete, a aluna pede para que ele ouça uma conversa, onde uma mulher com dois filhos terá a guarda das crianças mudada para seu marido canalha, apenas pelo fato de o juiz ser amigo do advogado do marido. Esse fato coloca de cabeça para baixo as perspectivas de Abe, pois sempre sonhara com um crime perfeito e seria uma benção que esse homem morresse para o bem da humanidade, sem qualquer problema moral. Como em Crime e Castigo, com o pobre e consumido estudante que mata uma mulher agiota, Abe, motivado, passa a vigiar a rotina do juiz, até que o plano tome consistência e ele o execute. Aparentemente a polícia está sem pistas, aluna e professor se alegram com o fato que está em todos os jornais e é a conversa preferida da Universidade. Entretanto, a jovem possui uma moral fora de qualquer suspeita e acredita nas palavras do professor que a verdade deve ser sempre respeitada, tendo até rompido com o noivo. Ao saber do plano de Abe e de sua frieza o caldo entorna e, como ela disse claramente, um assassinato abre a porta para outros.  A reviravolta é total, mas nem todos pensam como nossa linda estudante e o final não poderia ser mais inesperado. Excelente trabalho de Woody Allen que nos presenteia, anualmente, com suas comédias inteligentes ou com filmes sérios e seu inigualável gosto por trilhas sonoras magníficas. Imperdível, lá está o nosso Woody Allen inteiramente aberto.

QUE HORAS ELA VOLTA? DE ANNA MUYLAERT






BRASIL, 2015, 112 MIN. DRAMA
ELENCO:
REGINA CASÉ – VAL
CAMILA MÁRDILA – JÉSSICA
MICHEL JOELSAS – FABINHO
KARINE TELES- PATROA
LOURENÇO MUTARELLI – PAI DE FAMÍLIA
Diretora dos ótimos Durval Discos e É Proibido Fumar, Anna Muylaert compõe este filme, Que Horas Ela Volta?, baseado na relação com sua babá, que ganhou vários prêmios como de melhor atriz, Regina Casé e Camila Márdila, no festival americano de Sundance e prêmio de público no Festival de Berlim. Talvez seja indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. É uma história emocionante que vem de longa data neste nosso Brasil pós-colonial, desde casa grande e senzala. O peso da atuação de Regina Casé é fundamental para o desenrolar da trama, passando uma grande carga de emoção. Val (Regina Casé) é uma pernambucana que trabalha há anos em um casarão no Morumbi e uma espécie de faz tudo. Criou o filho da patroa que é mais apegado a ela do que aos pais, uma segunda mãe. Com Val discute seus problemas, é considerado inteligente e lindo, ainda mais, quando não consegue dormir procura a segurança em sua ex-babá. A família não se mexe do lugar nem para pegar um simples copo de água, tudo é atendido com solicitude pela empregada que não para um minuto sequer e sabe bem qual seu lugar na casa: em um quartinho pequeno e mal ventilado. Contudo, com o mito brasileiro, é considerada “da família”. As coisas começam a mudar quando recebe um telefonema da filha, Jéssica, pois Val fora obrigada a deixá-la em Pernambuco e ser criada por outra pessoa, enviando quase todo seu salário todos os meses por mais de 12 anos. Há três anos não se falavam e a garota vai prestar vestibular na FAU para arquitetura e quer ficar com a mãe. Começa a tensão social. Jéssica é inteligente, teve ótimos professores, gosta de ler e deseja a verdadeira cidadania para a qual está preparada. Ao chegar, a patroa não gosta dela, mas é obrigada a hospedá-la no quarto de hóspedes por sugestão do marido, que havia se encantado com Jéssica, por sua segurança, articulação e maturidade. Val fica desesperada com as atitudes da filha e principalmente pelo fato de ela “não saber o seu lugar” nesta cruel sociedade paulistana. Tudo é proibido, da comida e principalmente à piscina. Conflitos ocorrem e a garota resolve, na véspera do vestibular, sair da casa e ir para um canto qualquer. O interessante é que apesar da filha ser desprestigiada, Val continua amorosa e orgulhosa de Fabinho, sem conflitos pela intensa convivência que tiveram a vida toda. Fabinho, mimado, não passa no vestibular e Jéssica, solitária nessa ocasião tão angustiante, passa com pontos de folga. A constrangida empregada nem sabe como dar a notícia, mas está repleta de orgulho e satisfação. Jéssica, através de suas atitudes, muda as expectativas de vida da mãe e a convence que o futuro poderia ser melhor através da convivência das duas e de outro tipo de vida. Ótimo filme, com cenas muito bem resolvidas e espirituosas. O desempenho de Regina e Camila é muito convincente e nada estereotipado. Ótima direção e roteiro. Como curiosidade, vejam que, durante uma festa, Val oferece salgados e doces para os convidados e eles sequer olham para ela. É um ser invisível.

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

O JULGAMENTO DE VIVIANE AMSALEM DE RONIT E SHLOMI ELBAKETZ






GETT, ISRAEL, FRANÇA, ALEMANHA, 2014, 115 MIN. DRAMA
ELENCO:
RONIT ELKABETZ – VIVIANE AMSALEM
SIMON ABKARIAN – ELISHA – MARIDO
MENASHE NOY – ADVOGADO
Este excelente filme foi indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro deste ano. Os diretores, irmãos Elkabetz, fazem um trabalho de vulto e consistência ao denunciar com o longa o problema seríssimo de patriarcado e machismo ainda vigente no país, onde a mulher não tem voz. E por incrível que pareça é o mesmo tema do ótimo A Separação, neste caso iraniano! A belíssima e competente diretora faz o papel de Viviane, cabelereira, com quatro filhos que, muito infeliz, saiu de casa pedindo divórcio ao marido, com quem se casou aos 15 anos. Com vinte anos de casada não suporta mais sua condição perante a sociedade e há três  lutava com um processo contra Elisha, que se recusava em comparecer ao tribunal, porém aceitava seu dinheiro para pagar as prestações da casa que haviam comprado, onde ele vivia. Em Israel, esses casos são julgados por um tribunal de rabinos radicais, acrescido do fato que só o darão se o marido consentir em livrar a mulher. Apoiada pelo competente advogado (Menashe Noy em ótima atuação) o filme começa com eles no tribunal, onde nada é resolvido porque o acusado não comparece. Algum tempo depois o mesmo vai se repetindo, até que seu irmão, rabino, vai como seu representante. Finalmente o marido comparece, mas ele continua inflexível e obstinado em sua opinião. Os rabinos não aguentam mais o caso e impõe a presença de testemunhas para que seja logo resolvido. Aparecem testemunhas masculinas, como o irmão dela, que é francamente a favor que continue casada e testemunhas femininas, sua irmã e cunhada que dão razão a Viviane, pois Elisha era um homem seco e psicologicamente cruel com ela, apesar de não levantar sua mão contra a esposa. Era bem pior do que isso, além do mais, não o amava. Um vizinho casado também é intimado a depor, mas defende com unhas e dentes o modo como é encarado o casamente judaico. Sua mulher também serve de testemunha e a princípio não quer que o marido saia da sala, pois não é ninguém sem ele. Uma vez sozinha a coisa muda de figura.  Essas intervenções testemunhais dão um tom bastante humorístico e irônico ao filme, tirando um pouco a tensão que é muito grande do começo ao final. As perguntas do rabino, irmão de Elisha, são sempre machistas e a do advogado de Viviane inteligentes e perspicazes, fazendo com que os juízes torçam pelo divórcio. Depois de preso, por não comparecer, Elisha, após cinco anos de enrolação, finalmente resolve que dará o divórcio para a mulher. É um processo complicado, pois a sentença é escrita em um papel, que será dobrado de uma maneira especial e o casal, face a face, repetirá as palavras do juiz. Tudo começa quase normalmente, mas diante de certa frase ele empaca e desiste de tudo. Viviana se descontrola, mas imaginado o que seja e após uma conversa reservada com ele, admite que fará sua vontade. Ela estará, na verdade, parcialmente livre para continuar sua vida, mas após tantos anos e tanto sofrimento, qualquer mulher ocidental concordaria com sua atitude, pelo simples fato de ficar longe de um homem tão inseguro, inalterável e maléfico. A cena final é magnífica. Ótimo programa. Recomendadíssimo. Note que com o passar dos anos Viviane só fica ainda mais bonita e completa. O filme é o terceiro de uma trilogia, contudo os dois primeiros não foram exibidos no Brasil e este é livremente baseado em fatos reais. Ganhou vários prêmios.

sábado, 22 de agosto de 2015

LINDA DE MORRER DE CRIS D'AMATO






BRASIL, 2015, 75 MIN. COMÉDIA
ELENCO:
GLÓRIA PIRES – PAULA
EMÍLIO DANTAS – PSICÓLOGO
ÂNGELO PAES LEME - DR. FRANCIS
ANTONIA MORAIS – FILHA
Nesta comédia ligeira e graciosa, a diretora Cris D’Amato foca em uma dermatologista fascinada pela eterna beleza, que descobre a cura da celulite, através de uma droga oral. Muito ocupada e famosa, Glória Pires (ótima), a protagonista não tem tempo nem para a sensível filha que quer ser fotógrafa e é apelidada por ela de Sebastiana Salgada. Testando nela própria o medicamento, mas ajudada por Dr. Francis, que seria o responsável pelos efeitos colaterais, no dia da festa para a imprensa, morre acometida exatamente por esses efeitos que jurara não existir. Como em um dos contos de Sartre, os mortos recentes não sabem que morreram que aí começa a confusão. Desejando avisar o público de seu erro, tem de contar com um simpático psicólogo, neto de uma médium (Suzana Vieira), que herda o dom da avó, para comunicar à jovem filha sobre o perigo da medicação fatal. No roteiro diversas mulheres passam a ter sintomas iguais e os parceiros da Dra. Paula querem fugir da responsabilidade. Sem perceber, a morta passa a fazer terapia com o rapaz e resgatar seu passado. Tudo muito rápido, divertido e fácil. Boa comédia, comparando-se com o colapso geral do gênero na atualidade. Ótima fotografia.