terça-feira, 22 de novembro de 2011

O GAROTO DA BICICLETA DE JEAN-PIERRE E LUC DARDENNE








LE GAMIN AU VELO, BÉLGICA, FRANÇA, ITÁLIA, 2011 DRAMA
ELENCO:
CÉCILE DE FRANCE – SAMANTHA
THOMAS DORET – CYRILL

Esta história dramática e de belíssima estética dirigida pelos irmãos belgas Jean e Luc Dardenne, nos revela o drama de um garoto de onze anos, Cyril, que é rejeitado pelo pai. Sobre sua mãe não saberemos nada. Em Seraing, está internado em uma escola para meninos problemáticos e abandonados pelos pais. Durante toda a narrativa, será um garoto sensível, problemático e quase indomável pela perda do amor de seu pai, que não quer saber mais do filho e deseja um recomeço de vida livre. Inconformado com tamanha rejeição comete os mais diversos desatinos para ser aceito e amado. É uma narração nervosa deixando o espectador no limiar de grande ansiedade. Cyrill (ótimo Thomas Doret) terá uma única pessoa que aceita, a jovem mulher que conhecera em um ambulatório médico. Eles têm uma empatia mútua e Samantha se aventurará a cuidar do menino, como sua guardiã nos fins de semana. Todavia, ele é intocável, não aceitando carinho de qualquer pessoa, pois o único indivíduo que quer é seu pai, que se sente mal em sua presença. Essa realidade vai aproximá-lo da marginalidade, envolvendo-se com um traficante de drogas. Samantha, como uma fada madrinha, não poupará esforços para ajudá-lo e sente um amor realmente maternal por ele. O desenrolar da narrativa mostra os vários conflitos interiores de Cyrill, sua desesperança e sua evolução de um ser humano atormentado e difícil para o garoto terno e corajoso que é. A interpretação dos atores principais foge da pieguice deixando que nos envolvamos verdadeiramente nesse drama tão verdadeiro. Ótimo programa, vencedor do Grande Prêmio do Júri no último festival de Cannes. Os irmãos belgas Jean-Pirre e Luc receberam a Palma de Ouro em Cannes pelos filmes Rosetta (1999) e A Criança (2005). Grandes diretores e roteiristas.

A CHAVE DE SARAH DE GILLES PAQUET-BRENNER













ELLE S’APELLE SARAH, FRANÇA, 2010 DRAMA 111 MINUTOS

ELENCO:
MÉLUSINE MAYANCE – SARAH
JULIA JARMOND – KRISTIN SCOTT THOMAS

Outro ótimo filme francês em cartaz, revelando o talento de outra criança, Mélusine Mayance. Esse docudrama passa-se entre os anos de 1942, durante a ocupação nazista na França colaboracionista e a atualidade. As primeiras cenas são da Paris da Segunda Guerra Mundial, no bairro pobre de Marais, ocupada pelos judeus franceses, que seriam transferidos para o Velódromo de Inverno, em julho de 1942, onde ficaram por cinco dias sem água, alimento ou higiene, sendo que alguns se suicidaram por desespero e os demais foram enviados para os campos de concentração. São cenas fortes e realmente chocantes, pois foca principalmente a família da menina Sarah. Na hora da deportação as crianças serão separadas de suas mães, que desesperadas tentam pegar seus filhos em vão. Estavam sob o governo francês de Vichy. O fio condutor desse filme é a jornalista americana, Julia Jarmond (ótima Kristin Scott Thomas) que escreve uma matéria para a revista que trabalha sobre o genocídio conduzido durante aquele governo. Ela vive em Paris com o marido e filha adolescente há vinte anos e agora recebe um apartamento de Marais, hoje um bairro cobiçado, como herança. Curiosa para saber quem vivera lá, devido ao seu trabalho, começa uma investigação intensa sobre o antissemitismo e os moradores do prédio naqueles anos da II Guerra Mundial e acaba descobrindo que a família de Sarah fora moradora de parte do apartamento onde vivera seu marido na infância. Indagando o marido e seu sogro, provoca um desconforto familiar muito forte, pois eram anos que queriam esquecer e um episódio pouco discutido. Sua investigação sobre Sarah a leva de volta para os Estados Unidos e novamente para a Europa, Itália depois França. Todos os envolvidos nessa trama querem afastar-se da verdade, mas para ela o que importa é saber o destino das pessoas que foram exiladas, denunciadas pelos próprios franceses. A menina Sarah fora um personagem forte e sofrido, tendo escapado dos nazistas e adotada por uma boa família, finalmente seguido para outro país. O temor de Sarah é que tem certeza de ter provocado uma tragédia ao esconder o irmão caçula dos guardas da SS. O desenrolar do filme é angustiante e muito interessante, uma vez que a vida de todos será mudada à medida que os fatos forem sendo esclarecidos e finalizados. A direção é ótima e o desempenho das duas atrizes excelente, valendo o filme. Uma história muito bem contada cheia de surpresas e baseada no best-seller de Tatiana De Rosnay, com o mesmo título francês. Um programa imperdível, uma vez que é baseada em fatos tão incômodos como a perseguição antissemita.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

LATE BLOOMERS – O AMOR NÃO TEM FIM DE JULIE GAVRAS







LATE BLOOMERS, INGLATERRA/2011, 94 MIN.
DRAMA
ELENCO:
ISABELLA ROSSELLINI
WILLIAN HURT

Para quem aprecia o trabalho dos grandes atores Isabella Rossellini e Willian Hurt, esse é um ótimo filme. Apesar de mais velhos, ela com alguns quilinhos a mais e ele com um pouco de cabelo a menos, mas ainda em forma, bonitos e com ótimas interpretações, são dirigidos por Julie Gavras, do ótimo A Culpa é do Fidel (2006). O filme não foi muito elogiado pela crítica, comparando-se com o primeiro, mas é sem dúvida um trabalho com tema atualíssimo e bem dirigido. Eles vivem em Londres e estão casados há muitos anos, com três filhos, sendo o mais velho já um pouco grisalho. É uma família harmoniosa e bem sucedida. Hurt é um renomado arquiteto que prefere conviver com pessoas jovens e Isabella é uma ex-professora universitária, já aposentada, mas vigorosa e cheia de vida. Após uma perda momentânea de memória essa mulher passa a prestar mais atenção em sua vida e em sua idade e aparência. Ao entrar em um bar, cheio de homens, percebe que está invisível, coisa constrangedora para qualquer mulher que já foi muito admirada. No transporte público também cedem o lugar para ela, que faz que não vê. Um dia confessa ao marido que estão velhos e precisam mudar. Mudar o tipo de vida e o tipo de casa onde moram. Ele tem uma idade cognitiva bem jovem e não aceita essas investidas para a velhice, mas seu corpo reclama, obviamente, além do mais se recusa a fazer um projeto para pessoas da terceira idade. O impasse chega à separação, para que possam refletir sobre suas verdades. Os filhos e amigos se angustiam com esse problema e fazem o possível para solucionar a circunstância. Ocorre que ambos descobrem que ainda tem juventude dentro deles e que podem encantar outras pessoas. Contudo isso não os deixa mais separados, ao contrário, temos um final feliz. As cenas apresentadas durante a narrativa são bem verdadeiras e demonstram as dificuldades que aparecem ao longo do processo de envelhecimento que não vem de uma só vez, mas com o passar dos anos. Preparemo-nos para esse período de vida, que está cada vez mais longo para toda a população. Envelheçamos com a força e dignidade desses atores.

domingo, 6 de novembro de 2011

A PELE QUE HABITO DE PEDRO ALMODÓVAR









LA PIEL QUE HABITO, ESPANHA/2011, 120 MIN.
ELENCO:
ANTONIO BANDERAS
ELENA ANAYA
MARISA PAREDES

Este último trabalho de Almodóvar, criado a partir de um romance de Thierry Jonquet, Mygale de 1984, é simplesmente eletrizante e assustador. Aborda de maneira minuciosa questões difíceis como a escolha da sexualidade, moral, ética e filosofia no mundo moderno. Com cores bem mais sóbrias e um fundo musical de causar arrepios, a trama se desenvolve a partir da vida de um cirurgião plástico famoso, Antonio Bandeiras com atuação impressionante no papel do Dr. Robert Ledgard, que tendo encontrado sua mulher em chamas dentro de um carro, faz de tudo para mantê-la viva. Isso ocasiona uma série incalculável de dramas, a partir dele mesmo e de sua jovem filha com problemas psiquiátricos. A primeira cena nos mostra a belíssima cidade de Toledo e uma mansão bastante distante do centro, El Cigarral, onde o médico tem sua casa que funciona como clínica cirúrgica e laboratório de experimentos avançados. Na segunda cena, uma jovem pratica yoga em uma postura bastante inerte e avançada. Vera (Elena Anaya) veste um collant que cobre todo seu corpo. Essa jovem é uma espécie de prisioneira que vive em um enorme quarto, de onde não sai e recebe tudo que necessita através de um elevador. No início, a história não é facilmente compreendida. Quem será Vera e porque está isolada do mundo e serve como uma espécie de cobaia humana para Robert Ledgard, que pesquisa e descobre um novo tipo de pele, bastante resistente, que poderá salvar milhares de pessoas vítimas de queimaduras e outras moléstias tropicais. O tema TROPICAL aparece na música brasileira, em um dos personagens que fala português e na comparação, não explicita, à ilha isolada de Pitangui e sua clínica. Marisa Paredes é outro personagem enigmático, sendo a única pessoa a desfrutar da confiança do médico. Ela controla a vida da jovem Vera, através de enormes telões espalhados pela casa. Percebemos o fascínio de Robert por sua vítima. As coisas começam a se esclarecer a partir de um flashback de 2006, em uma festa de casamento. O presente está em 2012. Nesses seis anos Almodóvar tecerá toda a sorte de acontecimentos com os quais discutirá principalmente a vingança, a falta de ética, de compaixão pelo próximo e principalmente de problemas de como lidamos com o corpo que “habitamos”. O resultado é brilhante, totalmente no seu estilo exacerbado de contar o drama da vida privada. Sairemos do cinema sem poder esquecer o que levou essas pessoas a se comportarem de modo tão sofrido, mas a última palavra talvez seja realmente vingança. Programa imperdível para quem admira o estilo pesado desse intenso diretor, todavia, desta vez sem comédia, parecendo mais uma das antigas tragédias gregas. Um dos filmes mais impressionantes deste ano, talvez mais do que Melancolia, apesar do tema ser muito diverso.