sábado, 28 de maio de 2011

O HOMEM AO LADO DE MARIANO COHEN E GASTÓN DUPRAT










EL HOMBRE AL LADO, DRAMA, ARGENTINA /2009, 101 MIN.
ELENCO:
Daniel Aráoz – Victor
Rafael Spregelburg – Leonardo
Eugenia Alonso

Esses dois diretores argentinos dão uma lição de humor negro, com um tema
tão constante e banal como briga entre vizinhos. E o fazem muito bem. Desde o início nos vemos grudados à tela, prestando atenção em uma parede que está sendo demolida e outra, ao lado, que aos poucos vai perdendo sua pintura e reboco, até que uma luz surja entre elas. O mote do filme é a falta de privacidade. Em La Plata, na belíssima Casa Curutchet, construída pelo famoso arquiteto Le Corbusier, única na América Latina, vivem um arquiteto e designer reconhecido por sua aulas e seus trabalhos com móveis, sua mulher Ana e uma filha adolescente, que odeia os pais. A família considera-se fina e de alta classe, principalmente pela posse do imóvel, admirado pelos alunos de Leonardo e turistas. Durante uma noite são acordados com pancadas de obra, que não sabem de onde vêm. Leo descobre que seu vizinho, morador de um prédio ao lado, ou melhor, em frente ao seu quintal, está construindo uma janela, pois o sol não chega até ele. São poucos raios de luz e calor que quer, mas isso é IMPENSÁVEL para os moradores de Curutchet. Perderiam a privacidade com a janela e a intervenção desvalorizaria o imóvel. Esse “tipo”, Victor o vizinho, é uma pessoa que não perde a calma, sempre tentando enrolar qualquer interlocutor com sua lábia de argentino muito vivido. É também um homem comum, pragmático e um tanto vulgar. Leonardo obedece a sua mulher de maneira sistemática e ele terá de dialogar e convencer Victor de que o que faz fere as leis e as regras de boa vizinhança. Aqui vai a lição: a individualidade atual, falta de compaixão e fortes desavenças entre vizinhos e classes sociais por toda parte. Contudo essa lição nos é contada de maneira humorística apesar de, por vezes, contundente demais. Os dois homens conseguem chegar a um consenso precário, pois Victor conquista Leonardo através da simpatia e bom papo. Leonardo, que até se recusara a gravar uma entrevista sobre seu trabalho na Bienal de Veneza, por puro esnobismo, convence-se, aos poucos, das necessidades de luz para o outro. A solução não agrada a inflexível Ana e o trato é desfeito. Apesar dos pesares Victor conquista a simpatia da adolescente, através de um incrível teatrinho de marionetes eróticas. Ocorre que todo o esforço não bastou para que um fim negro viesse a acorrer, quando os pais deixam sua filha sozinha em casa e Victor tenta salvá-la de ladrões que arrombam a casa. Uma singular fábula sobre a falta de cortesia e compaixão dos nossos dias. Programão com imagens incríveis e bem feitas. O filme ganhou 5 prêmios merecidamente.

terça-feira, 17 de maio de 2011

CAMINHO DA LIBERDADE DE PETER WEIR
















THE WAY BACK, ESTADOS UNIDOS/2010, 133 minutos
ELENCO:
Jim Sturgess, Ed Harris, Colin Farrell, Saoirse Ronan

Peter Weir é um diretor que dá longos espaços entre seus ótimos filmes. O último foi de 2003 e agora produz este épico, baseado em fatos reais, apesar de algumas divergências entre quem foi o verdadeiro protagonista. Passa-se no início da Segunda Guerra Mundial, quando Stálin já fazia muitos estragos nos países limítrofes. Um grupo de jovens é enviado para a gélida Sibéria a fim de construir um gulag, uma prisão, que chegaram ao número de quinhentos. Os comunistas, de imediato, avisam que escapar é impossível, pela temperatura abaixo de 50 graus, pelo tempo muito variável e pelos camponeses que ganhavam prêmios com as delações. São na maioria presos políticos, mas existem também assassinos cruéis e contumazes, que mandam nos internos da prisão. Um jovem polonês, Janusz (ótimo Jim Sturgess) o protagonista, não se conforma e não aguenta mais aquela vida de privacidade, crueldade e trabalho forçado, dentro de minas sufocantes. Une-se, então, a outros homens que estão no limite da sanidade mental e que aderem a um plano de fuga, inclusive o útil assassino Walka (Colin Farrel). Aproveitando-se de uma nevasca brutal durante o inverno, fogem com alguma comida e armas e nada mais além do intenso desejo de sobrevivência. Serão postos à prova pela inclemência da natureza, naqueles rincões do quase Ártico. O plano seria seguir sempre para o Sul, a fim de chegarem à ferrovia Trans-Siberiana. São inúmeras as cenas de desespero que nos captam e nos deixam aturdidos. Aliás, a natureza desse belíssimo lugar é um fator preponderante para o sucesso da narrativa. Weir e o cinegrafista, Russel Boyd, se apropriam dessa vastidão para nos seduzir. Ao chegarem ao lago Baikal encontram água, que necessitam desesperadamente, caça e peixe. Nesse ponto percebem que são seguidos por uma jovem, Irena (ótima Saoirse Ronan), de dezesseis anos, que tenta entrar no grupo para salvar-se. Ela é aceita, mesmo após a recusa do engenheiro americano Mr. Smith (expressivo Ed Harris) e sua contribuição será muito bem vinda e valiosa. Dará um pouco de humanismo, através de pequenas conversas, ao grupo tão heterogêneo e brutalizado. Chegando à Mongólia, com a certeza do fim da jornada, são surpreendidos ao verem que Stálin e Lenin já haviam conquistado o país. A resolução de seguir a pé, por 6000 quilômetros, até a Índia é muito difícil. Seria isso ou a morte. Essas paragens são maravilhosas, planas e cheias de capim alto, com seus habitantes tão característicos. Bem sucedidos, mas exauridos de qualquer vigor, continuam pelo deserto de Gobi, sendo acometidos por miragens, até alcançar as montanhas altíssimas do Tibete. O grupo, durante essa travessia quentíssima e avassaladora, já diminui em tamanho e coragem, mas os laços afetivos vão se alicerçando a medida que as dificuldades crescem. As imagens são expostas de forma espetacular. O panorama até a chegada à Índia, em uma festiva plantação de chá, e à liberdade, junto ao desempenho dos personagens, são fatores de encantamento para os espectadores, contudo o diretor nunca apela para o sentimentalismo ou exposição além do limite necessário. Mesmo na cena final, essa diretriz é seguida com ótimo resultado. Programa imperdível.

domingo, 15 de maio de 2011

SINGULARIDADES DE UMA RAPARIGA LOURA DE MANOEL DE OLIVEIRA










Portugal/França/Espanha, 2009, 63 minutos
ELENCO:
Macário – Ricardo Trepa
Luísa – Catarina Walleinstein

Esse excelente filme do jovem centenário de 102 anos, Manoel Cândido Pinto, se apropria de um conto de Eça de Queiroz, 1874, para nos assombrar com a atualidade da obra. Passa-se na Lisboa atual, porém o português de Portugal - agradável de ser ouvido – é legendado de maneira mais moderna. Uma pena! Essa curta história tem como elementos principais temas bem atuais como a impessoalidade, a inflexibilidade humana, a paixão e o dinheiro. O filme começa dentro de um trem e não tem pressa. Os créditos vão sendo mostrados à medida que um fiscal vai perfurando as passagens dos viajantes. Dentre eles, uma senhora de meia idade com um rosto risonho e bonito e ao seu lado o jovem Macário. Ele a aborda para desabafar sua história de amor, que o sufoca e consome. Recebendo-o com carinho e interesse pede para que comece a contá-la o mais rápido possível. Ele se classifica como um “contador sentimental” e um “banco pobre”. Trabalhava em Lisboa com o tio, rico proprietário e negociante de tecidos, como contador. Seu escritório situa-se no mesmo plano de uma janela com cortina translúcida. Atrás dela há três mulheres: a mãe, um belo quadro com o rosto de uma mulher e finalmente a rapariga loura do título, Luísa, a filha. Ele se apaixona perdidamente por ela, ao observá-la pela janela de sua casa com um lindo leque chinês, estampado com um dragão e enfeitado com arminho. Os dois trocam olhares lânguidos e simulados. Ora ela o encara cobrindo parte do rosto, ora com o rosto descoberto, mas o olhar distante. Surge uma paixão imediata entre eles. Luísa é quase uma Menina e assim passa a ser chamada por Macário. Seu desejo é casar-se imediatamente, mas o tio, ao saber dos encontros, manda-o embora da casa e o despede o emprego. Sem emprego e boicotado pelos amigos do tio vê-se forçado a trabalhar em Cabo Verde, a pedido de um amigo, a fim de fazer fortuna e voltar bem sucedido. As cenas são verdadeiras pinturas clássicas, com enquadramentos perfeitos, cores belíssimas e móveis e objetos de época. O primeiro encontro entre o casal dera-se no Círculo Eça de Queiroz, um local grandioso, que é filmado com precisão milimétrica. Tem-se a impressão de estar em um grande museu, com quadros que contam uma história. Depois de algum tempo, Macário volta triunfante e pede a mão de Menina em casamento. É aceito, mas havia sido fiador do amigo que o enviara para Cabo Verde. A partir desse momento a trama segue por si só para um desfecho típico da inteligência e genialidade de Eça. Manoel de Oliveira conta a narrativa com maestria e é elogiado pelo elenco e por seu neto, Ricardo Trepa. Nesse final inesperado vemos o poder do dinheiro, a inflexibilidade humana diante de uma adversidade pessoal e suas consequências. Na cena que fecha o filme o trem segue sua viagem, até que despareça numa curva à direita. Esse belo trabalho foi incluído como um dos dez melhores filmes de 2009 pela famosa revista “Cahiers du Cinéma”. O diretor, apesar da idade continua com projetos de trabalho, tomara que consiga realizá-los. Vocês podem ver, nas imagens acima, uma fotografia de Oliveira e se surpreenderão como ele é jovem.

terça-feira, 10 de maio de 2011

REENCONTRANDO A FELICIDADE DE JOHN CAMERON MITCHELL












RABBIT HOLE , ESTADOS UNIDOS, 2010 DRAMA
ELENCO:
Nicole Kidman - Beca
Aaron Eckhart - Howie
Miles Teller - Jason
Dianne Wiest- Nat

Este drama muito bem explorado, Rabbit Hole, é baseado em uma peça do dramaturgo americano David Lindsay-Abaire, premiado com o Pulitzer. Ele foca a morte e suas trágicas conseqüências nas vidas paralelas, analisando a perda de um filho, oito meses depois, quando algum tempo já se passou, mas a dor intensa ainda não. Becca, a mãe, quer continuar em seu luto profundo, pois qualquer coisa que lhe dê algum prazer será uma traição a memória do garoto de 4 anos. Também é agressiva com os familiares e amigos que acabam se afastando e seguindo seus caminhos. O marido, Howie, guarda a consternação de outra forma bem distinta - reverenciando a imagem do filho, mas tentando seguir sua vida profissional e amorosa. Ocorre que Becca não quer nenhuma aproximação física com ele, não se sente capaz de dar amor e, assim, ambos participam de um grupo de ajuda. Lá, as coisas não vão bem e Becca, com uma afirmação contundente sobre Deus, abandona o grupo. Nesse ínterim sua irmã desajustada fica grávida de um músico negro e vai morar com a mãe (ótima Dianne Wiest), que por sua vez, também já perdera seu filho quando ele tinha 30 anos e carrega seu carma de uma terceira maneira. Becca, acidentalmente, descobre o endereço do jovem que matara seu filho e tenta uma reconciliação com o rapaz, seguindo seus instintos maternais, pois essa morte acidental é uma grande carga para alguém tão jovem carregar sozinho. Esse encontro é salutar para os dois. Entretanto seu marido permanece sozinho e sem explicações. Desesperado com seu isolamento tenta um convívio de amizade com uma oriental que pertencia a seu grupo. Becca, depois de uma mal sucedida reconciliação com a irmã e mãe, resolve que chegara o momento de se libertar dos pertences do filho e tentar um novo caminho, o que não acontece prontamente. Suas decisões são tomadas isoladamente e Howie sente-se traído. Os caminhos do filme não são fáceis, contudo a interpretação e direção desses personagens são muito bem dosadas e reais. Ligados por grande amor e respeito, os pais eventualmente descobrirão um modo de vida que lhes seja mais adequado para serem felizes. Apesar do tema pesado, as imagens do filme são belas e muitas tomadas ao ar livre, como se o tempo passasse incólume apesar dos pesares. As interpretações são muito boas e a direção impecável. Imagens do cotidiano de Becca e Howie fora de casa, convivendo com a família e amigos, torna a película bastante agradável e interessante de ser assistida.