sábado, 27 de junho de 2009

HÁ TANTO TEMPO QUE TE AMO de Philippe Claudel




Este sensível e inteligente drama trabalha com muitas emoções de amor, que por vezes são forçadas a não serem expostas. Na primeira cena vemos uma bela mulher, com expressão angustiante e entristecida. Logo em seguida é recebida por uma jovem radiante de felicidade. O contraste do semblante entre elas é impressionante. O filme conta uma intrincada estória, paulatinamente. Juliette (Kristin Scott Thomas, em espetacular desempenho) é a irmã mais velha de Léa (ótima Elsa Zylberstein). Elas estão indo para a casa de Léa e há muito tempo não se encontravam. Juliette saíra da prisão, após quinze anos de isolamento, e não é bem recebida pelo marido da irmã. Eles formam um jovem casal, com duas graciosas filhas adotivas vietnamitas, e um silencioso pai com problemas de saúde. Juliette se afasta de todos, sem manter diálogos, mesmo com as crianças que a recebem muito bem. Nesses momentos chegamos a ter aversão à figura enclausurada da atriz, que cometera um crime terrível, que não sabemos qual foi. Ela deverá viver, provisoriamente, com a família da irmã até que ache um emprego, aprovado pela justiça, e possa gerenciar sua vida. O comportamento de Léa é sempre muito receptivo e compreensivo em relação à Julitte, que não consegue romper a barreira que criara para se manter em seu casulo. Todavia, com a espontaneidade e carinho das crianças, passa a se adaptar ao novo mundo, mudando seu relacionamento com as pequenas. A partir daí, convivendo com os amigos de sua irmã e seu cunhado, ambos intelectuais, um novo clima vai se descortinando. Léa, professora de literatura, faz um belo trabalho com os alunos. Durante uma aula, descontrola-se ao comentar escritores, como o admirável Dostoievsky, que discorrem sobre a morte e assassinatos sem terem vivenciado esses problemas. Ela, muito emocionada, os aconselha a não levarem a literatura como dogmas de vida. Outros grandes escritores são mencionados. Luc, seu marido, aos poucos vai perdendo o receio pela cunhada, que demonstra gostar muito das meninas. Uma cena, em particular é emocionante, quando ele permite que a cunhada cuide das crianças, enquanto eles saem à noite. O calado senhor mostra-se uma ótima companhia para Juliette. Esta consegue trabalhar em um hospital como secretaria e, então, nos é revelado que fora médica. Todos esses segredos, mostrados em lento compasso, fazem com que a estória faça sentido e o espectador passa a compreender a posição dos personagens. Léa fora forçada, desde muito pequena, a esquecer-se da irmã pela vergonha que seus pais sentiam da filha criminosa, mas isso seria impossível e ela mantém um diário, onde pode expressar seus sentimentos. O diretor cria, como ponto de encontro íntimo entre as irmãs, um belo cenário. Trata-se de uma piscina pública, onde podem nadar e recordar seus dias de infância e juventude. Numa visita a um museu, através de Juliette, um belíssimo quadro de uma mulher extremamente entristecida, de Emile Friant, nos é mostrado. Chegando ao final do filme vemos a família unida e quase completamente feliz; Juliette de certa forma com sua vida profissional e pessoal bem resolvida. Contudo, quando o verdadeiro motivo do crime é descoberto, muitos conflitos emergem e relacionamento entre elas é posto em perigo, até que as peças entrem em seus devidos lugares. O final é bastante humano e compreensível. Para muitos um polêmica ficará aberta.

domingo, 14 de junho de 2009

STELLA de SYLVIE VERHEYDE









Esse excelente drama escrito e dirigido por Sylvie Verheyde é uma autobiografia, que se passa em 1977, Paris, quando ela mesma era uma garota que iria para a quinta série. O filme aborda além da ascensão espetacular de Stella, a vida e costumes franceses dessa época, enfocando muito a formação familiar francesa, que se mostrava bastante disfuncional.
Stella (ótima Léora Barbara) mora com seus pais em um bar, na periferia de Paris. O ambiente é pesado, promíscuo, perturbador, mas é nesse lugar que a menina de onze anos terá sua formação pessoal. Lá ela vivencia o abuso do álcool, brigas, infidelidades, jogos de todo tipo. A garota fora transferida para uma prestigiada escola, longe de sua casa, em um programa chamado enseignement national (ensino integrado nacional). Esse ambiente é totalmente diverso do que possuía, com alunos de nível cultural e social bem superior ao seu. Isso faz com que ela se exclua, voluntariamente, não participando das aulas e com desempenho escolar muito fraco. Ela é inteligente e observadora, porém sua bagagem de vida é muito diferente daquelas “crianças protegidas”. Sua realidade é a dos adultos, com suas frustrações e dificuldades, tendo ela a essa idade quase que um “passado”. Seus pais não a estimulam e não fazem questão de que ela estude. Sua avó mora no norte do país, onde ela passa suas férias. A senhora é quase uma prostituta. Com essa vivência ela não vê graça nas aulas, com exceção da matéria História, pois a professora “contava a vida das pessoas” e é precisamente isso que interessa à nossa heroína. Sentando ao lado da melhor aluna da classe, Gladys, filha de intelectuais argentinos, surge uma amizade baseada em semelhanças e diferenças, pois ambas tinham pais mais permissivos do que o normal. Convivendo com Gladys, ela passa a conhecer Balzac, Duras e outros grandes nomes franceses. Ela percebe que a escola e a erudição serão sua tábua de salvação para uma vida mais digna e culta. Também escuta discos emprestados pela amiga, os quais falam sobre a vida e seus encantos e desencantos. Com esse pano de fundo, essa extraordinária garota molda, sozinha, o futuro que gostaria de ter. Com fibra enfrenta diversos dissabores que advêm de seu rito de passagem da infância para a adolescência. Apesar do tema tão pesado, o filme é leve e sem julgamentos, apresentando, apenas, os fatos em si. Vemos, através de Stella, que a vida da diretora desse filme não foi fácil, mas ela tornou-se o que queria ser: uma intelectual respeitada. Parabéns Sylvie.

sábado, 13 de junho de 2009

INTRIGAS DE ESTADO






INTRIGAS DE ESTADO de KEVIN MACDONALD


Este suspense dirigido pelo escocês MacDonald é de tirar o fôlego, assim como DUPLICITY em cartaz. Ambos têm como roteirista Tony Gilroy. O diretor, entre diversas coisas, enfoca principalmente as crises pelas quais passam os jornais impressos nos Estados Unidos e o serviço de segurança. Para não falirem usam de qualquer subterfúgio, mesmo o da notícia sem consistência ou credibilidade. Aqui temos uma estória que é o oposto, os jornalistas fazem questão da confiabilidade das fontes e da justiça, trabalhando sempre com a polícia como fonte de informações, mas muitas vezes sonegando-as para os policiais envolvidos. Na primeira cena, vemos um acidente, à noite, e um garoto negro correndo desesperado, até ser friamente assassinado por um homem branco. Logo após, passa um garoto branco em uma bicicleta, que também é morto pelo mesmo homem, que foge com uma pasta prateada consigo. Nesse ínterim uma esplêndida ruiva jovem, que está esperando o trem do metrô na estação morre. Suicídio? O repórter veterano Cal McAffrey (ótimo Russel Crowe), de cabelão esparramado, está em seu carro velho e sujo, dirigindo-se para o local do primeiro acidente. Essas são as primeiras cenas mais fáceis de se compreender, pois o ritmo do filme será frenético e confuso. As três mortes, que parecem ser isoladas, vão ter uma grande correlação. O menino negro é traficante de drogas, o rapaz, entregador de pizza, e a jovem é assessora do senador republicano Stephen Collins (Ben Affleck). Bonitão e em plena ascensão política, investiga uma firma terceirizada, a qual cuida da segurança para o Pentágono. Ocorre que a jovem assassinada era amante do senador, que por sua vez é amigo de infância do repórter Cal, o qual já namorara sua mulher traída. Bom começo não? Russel irá dividir essa reportagem com um jovem novata do Washington Globe, Della (Rachel McAdams), que escreve um blog para o jornal. Os fatos vão se interligando até chegarem à empresa terceirizada, PointCorp, uma enorme corporação, formada por ex-oficiais do exército, e que envia soldados para o Afeganistão e Iraque, envolvendo uma verdadeira fortuna em dinheiro. Existe ainda o relações públicas mau caráter Dominic Foy (ótimo James Bateman). MacDonald explora muito bem o caráter bisbilhoteiro, com que os americanos perseguem a vida amorosa de seus representantes, e o senador é um prato cheio para isso. Os conflitos entre amizade e trabalho, verdade e mentira, fidelidade, traição e principalmente conspiração são fatores a serem discutidos nessa película. Ganhadora do Oscar Helen Mirren como Cameron, a editora estressadíssima do jornal fará de tudo para não perder esse caso e vender mais jornais do que os concorrentes, para manter o Washington Globo sem falir, já que a via on-line vai muito bem. O quarto final do filme é interessante, terminando com as grandes bobinas de papel sendo impressas e os jornais sendo colocados para a distribuição. Esse filme como o Duplicity é para quem gosta de muita ação e não tem preguiça de prestar atenção no enredo bastante rápido e intrincado. Vale a pena conferir.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

DUPLICIDADE de TONY GILROY






Esse suspense de Tony Gilroy critica a, cada vez mais usada, espionagem industrial. Ray (sexy Clive Owen) é o dissimulado e ardiloso agente da inteligência britânica. Claire (linda Julia Roberts) trabalha como espiã da CIA, uma mulher astuta, sedutora e sempre um passo a frente de qualquer outra pessoa. A ótima química entre esse casal nos conduzirá a uma longa trama leve e cheia de adivinhações por 125 minutos. O filme começa em Dubai, em 2003 até nossos dias. Lá eles se conhecem, ainda como operadores secretos. Depois de seduzi-lo com constantes negativas, e não o contrário, eles passam uma noite juntos e Claire escapa levando um envelope com importantes documentos. Após essa cena, vemos dois executivos maduros aos socos, sob uma fina chuva, no hangar de um aeroporto, para perplexidade dos passageiros que desciam da aeronave. Esses ótimos quatro personagens comporão a linha condutora do filme. Ele é feito em flashbacks de tempo e países, para que se conheça a estória dos principais protagonistas. Na verdade, querem deixar seus postos no governo e partir para uma vida mais glamourosa e milionária, trabalhando para grandes corporações como espiões industriais. Pinçam duas grandes empresas do mesmo ramo, cosméticos e produtos de limpeza, e vendem as informações obtidas como agentes duplos. Claire trabalha para o megaempresário Howard Tulley (Tom Wilkinson em excelente desempenho) e Ray para o rival ardiloso e sem escrúpulos Richard Garnsik (convincente Paul Giamatte) dono da Equikrom. Um espetacular produto será lançado no mercado e as duas associações saem a campo para descobrir do que se trata e lançá-lo em primeiro lugar. Entre os encarregados dessa espionagem estão nossos heróis. A dupla sempre se supera e não sabemos bem se estão juntos ou disputando por si só. É uma tarefa absorvente para a audiência seguir seus passos e a câmara veloz do diretor que não para de se locomover. A pergunta que fica é se os dois realmente se amam; percorrendo toda a narrativa. DUPLICIDADE é o que ocorre até o final inesperado, quando todos os pontos se convergem. É um filme inteligente, mas para algumas pessoas também um pouco cansativo com tantos percalços. Vale a pena pelo desempenho delicioso de Julia Roberts e Owen e dos principais atores coadjuvantes.

sábado, 6 de junho de 2009

A PARTIDA de YOJIRO TAKITA





Apesar do tema doloroso, a morte nos lembra que é, em muito, parte da vida. Esse é, apesar do tema, um filme leve com passagens de pura comédia.
Esse trabalho, ganhador do Oscar de melhor filme estrangeiro de 2009, inicia-
se com uma carro vindo ao longe, no meio de uma densa neblina. Próxima cena: é o preparo de um funeral de uma jovem que morrera, ninguém sabe ao certo como. Daigo (ótimo Masahiro Motoki) prepara o cadáver para sua última morada. Ele trabalha nessa rara profissão, que no Japão é considerada especialmente impura. Na verdade esse cellista perdera seu emprego, pois a orquestra em que tocava em Tóquio fora dissolvida, sendo forçado a ir com sua mulher para a cidadezinha onde nascera,já que sua mãe havia morrido há dois anos e lhe deixara a casa como herança. A encantadora propriedade fica à beira de um riacho e era um café, construído por seu pai, que abandonara a família, quando Daigo tinha apenas 6 anos. Ao chegarem ele é atraído por um anúncio de emprego que parece ser de uma agência de turismo. Contudo tratava-se de empregar alguém para preparar os mortos para sua última viagem, antes de serem cremados. Ele aceita o cargo pelo alto salário e por falta de outra opção. Sua repulsa inicial, pois nunca havia visto um cadáver antes, é aos poucos substituída pelo afeto e compreensão que esses rituais oferecem às famílias desoladas. Em cada casa o drama é diferente e isso passa a enriquecer sua compreensão de vida. Mika não fazia ideia do que era seu trabalho e sente-se muito feliz. Entretanto, ao descobrir sua verdadeira ocupação, dá-lhe as costas, indo morar com seus pais, assim como seus amigos de infância, pois há no Japão, embora não explicitamente, a casta dos intocáveis, os burakumin, que agora ele representa. Indignado com a atitude dos conterrâneos, continua fazendo o que passara a gostar, assim como a tocar seu violoncelo infantil. O instrumento achara intacto, com uma grande pedra áspera amarrada a ele. Seu pai havia sido um amante da música clássica ocidental e colecionara uma importante quantidade de discos. Daigo, agora sozinho, tem na figura de seu chefe a imagem do pai que gostaria de ter tido. O tempo vai passando e um dia, ao chegar em casa, depara-se com Mika que voltara. A jovem implora-lhe para que deixe o emprego, pois não se importava com dinheiro e além do mais estava grávida. A expressão do jovem músico é de alegria e dor. Providencialmente o telefone toca e ele tem de realizar o funeral de uma senhora, a quem amara desde a infância. Sua mulher o acompanha e, aos poucos, vai se deslumbrando com a maestria, técnica e amor demonstrados durante o ritual. Aceitando-o passam a viver, harmoniosamente, a espera do nascimento do filho. Em seus passeios junto às pedras do rio, ele escolhe uma particularmente lisa e branca, dando-lhe de presente. Sem compreender o significado daquilo, Daigo explica-lhe que esse é um costume milenar - as pedras cartas - que começara antes da escrita. Quando você amava alguém dava-lhe uma pedra que demonstrasse seu estado de espírito. Mika compreende, então, que ele estava muito feliz e também o significado da grande pedra que ele trocara com seu pai, quando era muito pequeno. Pouco depois recebe um telegrama para que retire o corpo do pai, que havia morrido. Daigo recusa-se a resgatá-lo. Jamais o reconheceria e não o via há mais de trinta anos. Cedendo aos pedidos de Mika seguem para uma cidade portuária, onde seu pai havia sido pescador, por todos esses anos. Com a chegada do serviço funerário serviço funerário, Daigo, que ainda estava ensimesmado, não admite que o corpo seja colocado no esquife sem uma cerimonia de purificação. Começa a lavar as mãos daquele homem estranho, sendo que uma delas estava dura e difícil de abrir. Para sua surpresa, vê a pequena pedra-carta que havia trocado há tantos anos com seu velho pai, que certamente o amara muito. À medida que vai lavando seu rosto, lembra-se de passagens de quando estavam unidos e felizes e, finalmente, consegue encontrar a imagem verdadeira de sua face. Isso o redime do ódio e da culpa que sentira. No quarto final do filme, vemos lindas cerejeiras em flor, os rios cujas águas passam ligeiras e Daigo em sua verdadeira vocação: cuidar dos mortos e consolar as famílias entristecidas. Você com certeza dará boas risadas nesta tragicomédia, mas prepara-se para levar um lencinho que irá precisar muito dele! Essa é uma estória cheia de minúcias e simbolismos. Vale a pena conferir!! Música excelente de Joe Hisaish.