domingo, 18 de maio de 2014

EU, MAMÃE E OS MENINOS DE GUILLAUME GALLIENNE




LES GARÇONS ET GUILLAUME À TABLE! , FRANÇA, 2013, 88 MIN. COMÉDIA DRAMÁTICA.
ELENCO:
GUILLAUME GALIENNE – GUILLAUME E MÃE
ANDRÉ MARCON
FRANÇOISE FABIAN
NANOU GARCIA
DIANE KRUGER
Essa interessante tragicomédia vinda do teatro, escrita e dirigida pelo habilidoso Guillaume, toca em um tema importantíssimo que é a busca da própria identidade. Dirigida e escrita por ele ganhou o César na França em 2014 como melhor filme, roteiro e ator. Com fundo autobiográfico, o filme começa com Guillaume minutos antes de entrar no palco para encenar a peça que seria sua autobiografia. As primeiras palavras são: Meninos e Guillaume à mesa! Sim, ele era o caçula e tinha mais dois irmãos que eram tratados como rapazes viris e esportistas, ao passo que Guillaume era um ser assexuado, visto pela família como uma menina em um corpo masculino e desesperançado. A causa era a mãe exuberante e crítica que o tratava como garota e esperava ser adorada por ele. Esse personagem vai procurar sua identidade das mais variadas maneiras, desde imitando perfeitamente as mulheres que adorava, até indo aprender dança flamenga na Espanha como se fosse uma dançarina. Para desespero do pai ele não muda e é enviado a colégios internos, onde vivi experiências horríveis e engraçadas até ir parar em uma escola na Inglaterra, onde pensava não sofrer bullying por ser um país mais aberto. Ledo engano. Com o passar do tempo, uma tia despachada convence-o que “se apaixonar” seria a melhor maneira de saber se era homossexual ou não. Feliz, parte para essa aventura, que não dá muito certo, pois detestava ver os homens sem roupas e o contato com eles. Com cenas engraçadas, permeadas de sofrimento psicológico, vamos para um final inesperado que encerra com chave de ouro esse inteligente trabalho sobre a masculinidade comprovada. Ótimo filme.

PRAIA DO FUTURO DE KARIM AÏNOUZ





BRASIL-ALEMANHA, 2014, 106 MIN. DRAMA.
ELENCO:
WAGNER MOURA – DONATO
JESUÍTA BARBOSA – AYRTON
CLEMENS SCHICK – KONRAD
SABINE TIMOTEO
Considerado um de seus melhores filmes, esse drama conta o relacionamento entre dois jovens, muito bem filmado, com belíssimas paisagens e poucos diálogos. Sendo totalmente contemplativo se divide em três partes, Brasil, Berlim e o encontro com Ayrton na Alemanha. A fala é, na maioria das vezes, substituída pelas ações e expressões de seus personagens. Tudo começa na perigosa Praia do Futuro, Ceará, quando dois motoqueiros exploram as belas dunas de areia da região e acabam com um mergulho no mar cristalino. São dois alemães, contudo um deles acaba morrendo afogado, apesar dos esforços do salva-vidas e bombeiro Donato (ótimo Wagner Moura). Sendo sua primeira perda, vai levar os pertences do jovem falecido para seu amigo Konrad. A partir daí, forma-se uma ligação amorosa instantânea entre eles que levará Donato a desistir da mãe e do irmãozinho e seguir para Berlim, cidade onde se sentirá acolhido e livre. No segundo ato é apresentada sua fase de adaptação a um país tão diferente e gelado, sendo que ele sente falta do sol e da paisagem de sua terra. Konrad tem uma oficina e não quer que ele parta. Depois de muitos anos temos a terceira parte, quando o já rapaz Ayrton chega à capital germânica, a fim de ajustar contas afetivas com Donato, que o abandonou e à família sem uma palavra de explicação. São cenas de grande comoção, entre brigas físicas e carinhos guardados. Konrad, que já havia se separado de Donato, volta para ver Ayrton, com um desfecho aberto e significativas imagens. Um filme nacional bastante distanciado da media produzida no Brasil e com grandes resultados. Esse premiadíssimo diretor franco-brasileiro tem uma biografia que vale a pena ser consultada.
 

domingo, 11 de maio de 2014

O PASSADO DE ASGHAR FARHADI




LE PASSÉ, FRANÇA, IRÃ, ITÁLIA, 2013, DRAMA.
ELENCO:
BÉRÉNICE BEJO – MARIE
ALI MOSAFFA – AHMAD
TAHAR RAHIM – SAMIR
ELYES AGUIS – MENINO FOUAD
PAULINE BURLET – LUCIE, FILHA ADOLESCENTE
LEA, FILHA CAÇULA
Asghar Farhadi, diretor iraniano, dirigiu o filme espetacular A Separação, onde discute a família e a desunião da mesma. Ele agora aborda mais um drama familiar no sensacional O Passado, filmado na França e sob o ponto de vista masculino. É uma história de gravíssimos conflitos familiares, todos escondidos, que virão à tona com a presença de Ahmad, segundo marido da franco-argentina Marie, atuado com grande sensibilidade por Ali Mosaffa. O desempenho de todos é muito impressionante e a história nunca é o que parece ser, pois quando algum conflito parece ter sido sanado, outros virão com força maior, com a intervenção de Ahmad, um homem sensato, pragmático e que não suporta mentiras e situações agressivas e veladas. O filme começa no aeroporto, quando ele chega do Irã, após quatro anos, e sua ex-mulher o aguarda no saguão. Nada é explicado, tudo é deduzido com o passar das cenas. Ele estranha que um hotel não tenha sido reservado e passará uns dias em sua antiga casa. Terá a oportunidade de ver as meninas, que o consideravam como pai e ansiavam por sua presença. Ao chegar, a casa está em reforma e de cabeça para baixo. Além do mais um garoto arredio vive no mesmo local, pois é filho do atual namorada de Marie, dono de uma lavanderia em Paris. Sua chegada causa uma avalanche de sentimentos e confissões jamais esperada, pois sendo pragmático não deixará que nada fique sem solução e as culpas guardadas pelo resto da vida. Sua presença se justifica pela formalização do divórcio, já que Marie pretende se casar novamente. Logo no início vemos que o garoto de cinco anos gosta de morar com as garotas, uma pequena e outra adolescente, todavia não suportou a presença do ex-marido, assim como Lucie não concorda, absolutamente, com o passo que sua mãe irá dar. Esses conflitos serão resolvidos com o decorrer da história, mas o passado nos trará várias perguntas. Marie pede para que ele seja o mediador em muitas dessas desordens. Concorda, mas tudo terá que ser elucidado com honestidade e sem mentiras. No caminho do tribunal, Marie revela que está grávida para espanto de Ahmad. Só então ficamos sabendo que não tiveram filhos e as meninas são fruto de outro casamento. Samir anda preocupadíssimo, sua mulher está em coma e hospitalizada há oito meses. É o fato mais determinante para a enxurrada de mal entendidos e mentiras passadas. Todos sofrem, inclusive Ahmad por ver as meninas e o garotinho em tal posição. A desunião da família está em seu ápice. Marie encontra-se descontrola e histriônica, os filhos de ambos em pânico e os motivos do coma mal contados. O final emocionante não pode deixar de ser bem observado. É ambíguo, mas a chave desse roteiro escrito pelo próprio diretor. Filme absolutamente imperdível e atual. O cinema iraniano e sua literatura estão em fase muito profícua. Vamos aproveitar.



quarta-feira, 7 de maio de 2014

GETÚLIO DE JOÃO JARDIM





BRASIL/2014, 100 MIN. DOCUDRAMA
ELENCO:
TONY RAMOS – GETÚLIO
ALEXANDRE BORGES – CARLOS LACERDA
DRICA MORAES – ALZIRA VARGAS
Baseado nos últimos dias do presidente Getúlio Dornelles Vargas (1882-1954) João Jardim mostra como o cinema brasileiro pode produzir um ótimo docudrama, com excelente fotografia de Walter Carvalho, composição de época do Rio de Janeiro dos anos 50, música excelente e atuações primorosas do ator Tony Ramos no papel principal e de Drica Moraes como a filha Alzira Vargas, a preferida do presidente. Nos vinte anos em que esteve a frente do governo como Chefe de Estado, 15 deles ininterruptos, de 1930 a 1945 (oito como ditador) e mais três, de 1951, eleito pelo voto direto, até seu suicídio em 1954. O filme se concentra nos dezenove últimos dias de seu governo, onde ficou praticamente encerrado no palácio do Catete, no Rio, capital federal da época. Tony Ramos fez uma imersão de quase dois meses dentro do palácio, a fim de poder respirar a mesma atmosfera do líder. O enredo se inicia no dia do atentado da Rua Toneleros, que acabou matando o major Rubens Vaz e ferindo a perna do então seu maior inimigo político, o jornalista Carlos Lacerda (Alexandre Borges). Aí se desencadeia o fim de seu destino como brasileiro autoritário, inescrupuloso quando necessário e adorado por parte do povo. Era chamado de “pai dos pobres” por sua elaboração em leis sociais e trabalhistas que beneficiaram a classe baixa e a inclusão da Petrobrás no Estado. Seu perfil era muito discutível, pois teria uma sintonia com o regime de Hitler e Mussolini, durante a Segunda Guerra Mundial. Nesses dias finais aparenta ser um homem discreto, refinado, mas sem grandes luxos. Contudo sua vida era o poder a qualquer custo. Durante o atentado o governo já não possuía uma base coesa e até seu grande protetor, O Anjo Negro, acabou preso por ser considerado suspeito na trama. Vivia cercado por sua filha Alzirinha, também sua confidente e conselheira, e seus outros filhos e mulher. Nesses dias tenta uma viagem a Belo Horizonte, onde Juscelino era governador, mas foi vaiado pelo povão.  Encarcerado no Catete tenta descobrir o mandante do crime e passa a ver que estava sem saída. Nesse momento, decide escrever uma carta testamento, dizendo que saia do governo para entrar na História, guardando-a em sua escrivaninha, caso chegasse esse dia. O filme mostra seus colaboradores tentando de tudo para ampará-lo, mas os fatos levam ao pedido de Carlos Lacerda e outros políticos para que renuncie ao mandato. O jornal e a mídia em geral não o apoiavam. Veremos o interior do Catete, lindíssimo, as louças e talheres com que comia e suas roupas, incluindo o pijama que usava quando morreu. Sem mais o que fazer, pois jamais sairia de seu posto, anuncia a sua filha que tudo correria bem e que de lá só sairia morto. Fechado em seu quarto e com medo de deixar o local e ser preso, covardemente não honra seu compromisso com a nação e atira contra o próprio peito, morrendo. O filme é um ótimo motivo para recordarmos os fatos históricos tão importantes da época e revermos seus principais personagens. Tony e Drica são impecáveis em seus papéis, assim como todo elenco nos papéis secundários. Café Filho era seu vice e Tancredo Neves seu ministro da Justiça. Vale a pena ser visto independentemente da idade do espectador. Ele foi considerado um dos grandes políticos do Brasil.