segunda-feira, 31 de outubro de 2011

O PALHAÇO DE SELTON MELLO















BRASIL/2011, 90 MIN. – COMÉDIA DRAMÁTICA
ELENCO:
SELTON MELLO – PANGARÉ – (BENJAMIN)
PAULO JOSÉ – PURO SANGUE
LARISSA MANOELA
TEUDA BARA
JORGE LOREDO
DIREÇÃO DE ARTE – CLAUDIO AMARAL PEIXOTO
TRILHA SONORA - PLÍNIO PROFETA

Essa ótima comédia dramática, dirigida, interpretada e co-escrita por Selton Mello só vem a confirmar a grandeza desse artista mineiro de 38 anos. Mais do que um filme delicado e inspirado é uma obra de arte por sua fotografia e cenários. Também um poema em homenagem à infância, ingenuidade e encantamento. Desde sua apresentação com linhas formando desenhos à La Saul Steinberg, que pode ser visto na Pinacoteca, até os créditos que não devem ser perdidos. Benjamin é um jovem que herdou um circo mambembe do pai, o palhaço Puro Sangue, interpretado magnificamente por Paulo José. Ele percorre o interior das Minas Gerais com suas pequenas cidades e grandes montanhas de beleza ímpar. O circo é acanhado, com apenas três veículos caindo aos pedaços, mas com poucos e grandes artistas que amam a profissão e fazem tudo com excelência e honestidade. Eles estão em apuro financeiro e Benjamin, que atua no picadeiro como palhaço fazendo dupla com o pai, não encontra sua identidade, quer como documento, quer como ser humano e nem ajuda. Pangaré é um faz tudo, que descobre o nome do prefeito e a mulher, o nome do maior pinguço da cidade e a zona de meretrício, sendo temas que sempre farão as pessoas rir. Na primeira apresentação estão felizes com o número 57. Sim 57. Pois são cinquenta e sete ingressos vendidos. Essa será a maior platéia alcançada no drama. O mundo artístico reflete uma família feliz e unida, que tomará qualquer atitude para que a herança circense seja mantida. Ocorre que Benjamim anda muito triste, sem namorada, sem ter certeza de seu rumo e necessitando desesperadamente de um ventilador, que não tem dinheiro para comprar. Em um dado momento, apesar da união, ocorrerão duas baixas - a de uma linda artista engolidora de fogo e a do próprio Benjamin, que sai a cata de uma identificação pessoal. Será um aprendizado importantíssimo em sua vida e talvez a melhor parte do filme, onde reveremos grandes artistas, Moacyr Franco como o delegado desonesto, Justo, que profere um monólogo de quase 3 minutos. Outras surpresas serão o menino prodígio Ferrugem, adulto e 25 centímetros mais alto, e o Zé Bonitinho, contando piadas como só ele sabe fazer. Desligado do circo pode repensar no que o pai lhe disse: Cada um deve fazer o que sabe de melhor (uma importante afirmação dos filósofos gregos) – o gato toma leite, o rato come queijo e eu sou palhaço, afirma Puro Sangue. Devidamente registrado e com uma carteira de identidade reluzindo, aventura-se para encontrar uma moça que havia se interessado por ele e um emprego. O encontro é frustrante, o trabalho desagrada e nosso herói acaba voltando, feliz, a reencontrar sua família circense em uma minúscula cidade, quando em cena aberta, reaparece diante do pai. Temos momentos emocionantes e líricos nesse trecho final. A linda garotinha, filha de um casal de artista, que vivia suspirando pela bela engolidora de fogo, finalmente terá sua chance de atuar, assim como Pangaré, que além de estar feliz encontra uma namorada, nas mesmas condições do pai. Uma ode ao passado sem maldades, grandes tragédias e pequenas coisas que nos faziam realmente felizes, em um não tão distante anos de 1970. A trilha sonora e a direção de arte fazem com que tudo isso se feche maravilhosamente bem.
Temos muita sorte em contar com um Selton Mello em nosso país, sempre oferecendo trabalhos de grande qualidade, quer seja no cinema ou na televisão. Para mim o melhor artista do momento. O filme foi premiado no último festival de Paulínia.

domingo, 16 de outubro de 2011

MEU PAÍS DE ANDRÉ RISTUM






BRASIL, 2011, DRAMA, 90 MIN.
ELENCO:
RODRIGO SANTORO – MARCOS
CAUÃ REYMOND – TIAGO
DÉBORA FALABELLA – MANUELA
PAULO JOSÉ – ARMANDO

Este é um filme que poderia ser bom. A imagem é ótima, os artistas persuasivos, contudo o roteiro não se desenvolve. É a história de uma família com dois rapazes e o pai viúvo. O mais velho, Marcos, mora na Itália e se casa com uma bela moça de lá. Não são ligados ao Brasil, por nenhum motivo, principalmente porque é um alto executivo no país. Seu pai morre e vê-se obrigado a voltar e colocar as coisas em seus lugares, uma vez que seu irmão, Tiago, é um irresponsável viciado em jogos de azar, perdendo uma fortuna aí. Para surpresa dos rapazes, descobrem que têm uma meia-irmã com problemas mentais. Apesar de seus 25 anos, sua idade mental é de uma criança de cinco. Porém era amada pelo pai e estava internada em uma instituição por causa de surtos seguidos. O filme é todo movido através de fotografias deixadas pelo pai. Nesses velhos álbuns conseguem refazer a trajetória familiar. Parece bastante interessante o que foi dito, mas o filme não consegue rolar e, quando acaba, uma sensação de vazio nos acompanha. Não indico, a não ser para quem goste do desempenho desses atores.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

O DIA EM QUE EU NÃO NASCI DE FLORIAN COSSEN










DAS LEID IN MIR, ALEMANHA-ARGENTINA, 2010
DRAMA, 95 MIN.
ELENCO:
JESSICA SCHWARZ – MARIA
MICHAEL GWISDEK – ANTON
RAFAEL FERRO – ALEJANDRO

Atualmente temos uma ótima safra de filmes enxutos e de grande profundidade de ideias. Entre eles está certamente Das Leid in Mir, do jovem diretor Florian, nascido em Tel-Aviv e criado em Israel, Canadá e Espanha, estreando esse belíssimo longa-metragem, do qual também participou do roteiro escrito por Elena von Saucken. Após ter tido uma bolsa de estudos de um semestre na Universidade de Cinema de Buenos Aires, pesquisou intensamente para criar esse trabalho, que nos conta os sofrimentos sofridos pelos europeus e sul-americanos em suas ditaduras militares. Estrelado brilhantemente pela excelente Jessica Schwarz, na pele da jovem Maria de 31 anos, por Michael Gwisdek (Anton, seu pai) e Rafael Ferro (Alejandro, o namorado). Na primeira cena vemos Maria treinando em uma piscina, na Alemanha, e logo em seguida despedindo-se do pai, Anton, que a trata com muito carinho e cuidados. Em um vôo para um campeonato no Chile, seu avião faz uma conexão em Buenos Aires. Na sala de espera reconhece uma cantiga de ninar, cantada em castelhano por uma mãe e se emociona as lágrimas, pois entende o sentido, apesar de não falar uma palavra em castelhano. Perde a conexão e decide ficar na cidade e contar o ocorrido a seu pai. Logo em seguida ele chega ao hotel onde está hospedada e, constrangido por sua firmeza, é obrigado a revelar que ela passara três anos na cidade, quando ele trabalhara lá, nos finais dos anos setenta. Ela nascera em 1980, fora adotada, e em seguida voltaram para a Europa. Sua mãe cantava aquela canção para fazê-la dormir. Além disso, Maria encontrara, em um antiquário, um velho bonequinho, Topo Gigio, pelo qual sente a maior identificação. Ela quer saber a verdade, além do que lhe é oferecido e começa uma pesquisa de sua real identidade, com ajuda de Alejandro, um guarda que falava alemão, e se encantara por ela. Para desespero do pai, com medo de perder o afeto da filha, as coisas vão tomando um rumo que se aproxima do governo militar e suas atrocidades do fim da década de setenta. Sim, há uma família a ser investigada com ajuda da tradução de seu namorado. Caminham pela cidade de Buenos Aires, mais plástica e bela do que nunca, para desvendar o mistério. À medida que provas vão aparecendo o espectador fica muitíssimo incomodado, pelas mudanças de rumo e em quem acreditar e no que acreditar. Esse é o maior mérito do trabalho, muito bem interpretado por seus atores, sem exageros e deslizes. O final, como nos filmes europeus, não é exatamente feliz, mas nos deixa refletindo sobre a adoção, o amor de quem educa e nas mazelas das famílias destroçadas pelo regime de então. Apesar disso, política é o que menos importa, mas sim o conceito de paternidade e família. Maravilhoso programa para quem gosta dessas histórias mais cerebrais, como desafogo do cinema americano atual.

domingo, 9 de outubro de 2011

COPACABANA DE MARC FITOUSSI










COPACABANA, FRANÇA/BÉLGICA, 2010
COMÉDIA DRAMÁTICA, 107 MINUTOS
ELENCO
ISABELLE HUPPERT
LOLITA CHAMMAH
JÜRGEN DELNAET

Outra ótima comédia dramática de baixo orçamento e grande criatividade em cartaz. Desta vez estrelada pela excelente atriz Isabelle Huppert dos densos A Professora de Piano, Mulheres Diabólicas e Minha Terra, África. O roteiro privilegia a trajetória de uma mulher livre de qualquer preconceito, hippie na juventude, decidida a ter uma visão geral do mundo e agora, cinquentona, com as mesmas perspectivas de outrora. Nas primeiras cenas vemos uma mulher magra, de mini saia e casaco de pele andando pelas ruas e entrando em uma loja de produtos de beleza, pedindo para ser maquiada e querendo algumas amostras grátis. A vendedora explica que só poderá dá-las se ela fizer alguma compra, como não tem dinheiro pede que reforce no batom. Agora com um close, vemos que não se trata de uma adolescente ruiva, mas de Babou, uma mulher de meia idade, magra e exagerada, com uma filha conservadora de 22 anos, que irá se casar. Essa figura de cabelos vermelhos mostra-se infantil, egoísta e desagradável no contato com a filha e a vida. Desempregada, sempre por largar o que está fazendo por não gostar, é avisada que Esmeralda irá se casar. A jovem, entretanto, é explicita em dizer que tem vergonha da mãe e não a quer no casamento, saindo logo em seguida. Sozinha, vemos lágrimas correr dos olhos de Babou que se sente ferida, pois criara a filha para ser feliz e desapegada de conceitos burgueses. Desabafando com um amigo que a ama, o espectador vai mudando a avaliação que fizera da personagem principal e vendo que se trata de uma mulher livre, mas sensível quanto aos seus afetos maternos. Não querendo polemizar com a jovem e resgatar seu amor, decide largar tudo, já que fora rechaçada, e partir para a fria cidade litorânea Oostend, na vizinha Bélgica para ser vendedora de imóveis em timeshareflats para turistas estrangeiros. Chegando com mais 3 candidatos percebem que na verdade o treinamento constituía em distribuir panfletos pelas ruas, a fim de que as pessoas fossem à companhia ver os imóveis. Não seriam corretores, só com o passar de muito tempo. Antes de se instalar em seu conjugado na firma, conhece um grupo de nativos que a convidam para sua mesa. Apesar de ser bem mais velha do que eles, seu charme e beleza são indiscutíveis e um jovem pescador, segundo ele mesmo um garanhão, se apaixona por ela. A partir daí é ajudada por uma das moças a ir ao lugar correto, onde pudesse abordar os indivíduos certos, ou seja, no porto, na chegada dos navios. O sucesso é imediato e sua rigorosa chefe se encanta com a grande quantidade de pessoas que passam a visitar a imobiliária. Com o afastamento de uma das vendedoras ela é imediatamente elevada à categoria de corretora, com muito sucesso. Sendo uma mulher muito viajada e desprovida de preconceitos é bem aceita pelos estrangeiros que aportam no local e chega a fazer uma venda bem rápida. Paralelamente, se compadece de um jovem casal de músicos de rua e, como era inverno, os convida a irem clandestinamente a seu conjugado para passar a gelada noite. Esse convite é feito duas vezes e infelizmente descoberto por sua superior, com seu depoimento espontâneo, que passa a informação a diante. Um contato também é feito por sua filha, que espera ter toda a atenção da mãe, mas se sente ferida com a presença do casal da rua. Desentendo-se com a mãe, ouve o que não quer: ficaria sentada a frente de uma televisão o resto da vida e teria sua liberdade cerceada. Logo após a demissão, pega todo o dinheiro e vai ao Cassino vizinho, pois além de tentar a sorte, ali se apresentaria um grupo de escola de samba brasileiro, país que não conhecia, mas ouvia todas as boas músicas de samba e bossa nova, era seu sonho de consumo. Ganhando uma bolada exatamente na hora em que o grupo passa ao seu lado, uma nova ideia vem a sua cabeça. Esse já é quase o terço final do filme. Já havia procurado a filha e soubera da desistência do casamento, mas conversando com o noivo ele oferece uma nova abordagem de vida para sua jovem noiva, com a ajuda de Babou. Essa mulher extraordinariamente livre empenha-se em uma nova aventura e seu presente de casamento será o mais inesperado possível. Uma bela homenagem ao Brasil e à música brasileira que preenche o filme do começo ao fim. Bélgica e Brasil, dois extremos tão diferentes. A atriz se entrega totalmente nesse papel, convencendo a platéia de seu brilho e diferente modo de encarar a vida. Programa divertido e reflexivo ao mesmo tempo, com tanto consumismo comendo-nos pelas bordas. Belíssima atuação de Isabelle e direção segura do jovem premiado Marc Fitoussi. Uma curiosidade interessante é que Lolita Chammat, filha na ficção, é também sua filha na vida real.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

TRABALHAR CANSA DE JULIANA ROJAS E MARCO DUTRA









DRAMA – BRASIL/2011, 99 MIN.
ELENCO:
Helena Albergaria - Helena
Marat Descartes - Otávio
Naloana Lima - Paula
Marina Flores – Vanessa
Esse ótimo drama com o título Trabalhar Cansa, tanto pode ser entendido ao pé da letra, como não trabalhar também cansa. Um filme paulistano e inovador faz com que não tenhamos a sensação de estar em frente à tela de televisão com artistas globais. São atores de alto padrão, principalmente a tímida Helena e Otávio com um timing muito preciso. O tema é sobre a classe média, que se vê confrontada com a falta de emprego e as consequência de tal fato, além de flertar com o terror. Helena sonha em montar um mercadinho em um local onde já havia outro, mas seus donos desapareceram misteriosamente, deixando para trás o local quase todo montado, necessitando apenas reparos e faxina. Quando ela chega a casa, depara-se com Otávio acabrunhado. Ele fora substituído em seu emprego por um rapaz bem mais jovem e inexperiente. Apesar da má hora, a decisão já está tomada e passam a fazer as melhorias no lugar, que não está nada limpo com insetos saindo de todos os cantos. Eles são um casal amoroso e que ainda se amam, tendo uma filha pequena a ótima Marina Flores no papel de Vanessa. Alguém terá de ficar com ela e será a honesta Paula (Naloana Lima), que conquistará a confiança da criança. Apesar dos esforços, Otávio não consegue arranjar uma colocação e isso vai minando o relacionamento do casal. Tampouco o mercadinho vai bem, pois Helena não tem o perfil de uma empresária agregadora e passa a maltratar os funcionários. Além do mais, aos poucos um movimento de terror se inicia no local, provavelmente de magia negra. O filme não tem música o que ajuda a entramos de cabeça nessa atmosfera desagradável de falha humana e superstição. Eliminado os problemas principais, entramos na cena final em que Otávio deixa sair de dentro de si toda sua angústia e desesperança.
Ótimo rumo do cinema brasileiro que poderia ser continuado, espelhando um pouco mais os problemas diários também da classe média que tanto se expandiu. O filme foi escolhido para o festival de Cannes e premiado no festival de Paulínia. Esses jovens (29 e 31 anos) curtas-metragistas fizeram um ótimo trabalho minimalista e diferenciado.