segunda-feira, 1 de setembro de 2008

PELOS MEUS OLHOS de Icíar Bollaín



Direção de Icíar Bollaín
Esse belo drama espanhol tem o título de Te Doy Mis Ojos. Veremos que ele deveria ter continuado em português também. É mais forte e significativo. As cenas iniciais da película nos mostram a cidade de Toledo e um conjunto habitacional de prédios quadrados, com tijolos a vista. É noite e uma jovem joga dentro de uma mochila três ou quatro roupas e vai imediatamente ao quarto do filho que dorme, vestindo-o às pressas. Há uma grande urgência na ação e os dois correm do apartamento dirigindo-se para outro local. Apesar da hora, eles são recebidos por Ana (Candela Penã), irmã de Pilar (ótima Laia Marull). Pilar abandonara o truculento marido Antonio (Luis Tosar, em boa atuação) para refugiar-se na casa da irmã com seu filhinho. Ana compreende muito bem a situação em que sua irmã se encontra. Sendo espancada pelo marido resolve tomar novo rumo na vida. O primeiro conselho que recebe é procurar um emprego, sendo admitida a trabalhar em um museu, recomendada por Ana que é restauradora. Contudo, Antonio ao ver-se sozinho não aceita essa condição e passa a cortejar sua mulher com presentes, bilhetes, e palavras de amor. Aproxima-se de Pilar com a promessa de estar freqüentando um grupo de ajuda para homens violentos como ele. Eles se amam, passando a encontrar-se escondidos, como um casal de namorados. Ana jamais aprovaria esses encontros e estimula sua irmã a se separar e ter vida própria. Ana está noiva de um escocês e juntas providenciam os preparativos do casamento. Agora formam uma grande família: Ana, o noivo, Pilar, Juan e sua mãe. Esta é uma mulher que sempre foi infeliz no casamento, agüentando o temperamento difícil do marido em silêncio e agora está viúva. Vinda de outra geração quer que sua filha aceite seu infortúnio de qualquer maneira. O terapeuta de Antonio é muito eficiente, simulando situações em que seus pacientes se encontram antes da ira começar. É um calor, um desconforto incontrolável. A isso ele chama de fúria, que uma vez identificada precisa ser controlada. Pensar em uma cena de paz, sair do local para encontrar-se consigo mesmo ou escrever em um diário com páginas coloridas que oferece aos clientes são subterfúgios válidos para aplacar a ira. As páginas vermelhas escuras são para os momentos de desespero. Com o assédio amoroso dando resultado, Antonio consegue que Pilar volte para ele. Esse era um amor muito sustentado “na pele” dos dois e no sexo de altíssima excitação. Eles tinham um jogo infalível em que havia uma troca de presentes, contudo eles eram seus corpos. Antonio pedia as orelhas de Pilar, seus seios, suas coxas, seus braços e ela lhes dava, inclusive seus olhos. Decide-se a voltar para seu marido, durante a festa de casamento de Ana, onde reina um clima de amor e alegria. Desentendendo-se com sua irmã, desabafa-lhe que ninguém pode saber melhor do que ela onde era seu lugar, ou seja, ao lado do marido, que havia mudado. Ana chora na festa, não de felicidade, mas pela decisão errada que Pilar tomara. O medo é uma constante na vida de Pilar. Durante os nove anos em que vivera com Antonio, no trabalho atual e em sua casa a qual retornara. Quando Antonio chega ela e o filho sempre se assustam, por não saberem em que estado ele se encontrará. A essência de Antonio não mudou apesar da busca terapêutica. Eles formam um par conflitante e imaturo. À medida que Pilar se firma no trabalho e convive com outras mulheres, adquire nova confiança que a deixa mais bonita e madura. Contudo o mesmo não ocorre com Antonio. Tendo uma auto-estima baixa e medo de perder sua mulher, fantasia situações ridículas e torna-se extremamente controlador. Esses problemas são discutidos à exaustão com o terapeuta, mas uma mudança de atitude para ele é muito angustiante. Tem medo de perder as rédeas sobre ele mesmo e seu relacionamento com sua mulher. Pilar faz um trabalho voluntário em uma igreja-museu em Toledo, mostrando os quadros aos turistas e explicando a razão pela qual eles foram pintados daquela maneira, sempre com um fundo mitológico na origem das obras. Isso ela faz com brilhantismo, pois adora pinturas antigas. Antonio não aceita, no entanto esforçando-se dá-lhe um livro de arte. Aos poucos ele vai se corroendo de ciúmes pelo sucesso de sua mulher e torna-se mais agressivo e inseguro, indo vigiá-la, no museu, durante suas explicações. O celular de Pilar não para de tocar, mas ela se esquece de ligá-lo, pois nunca tivera um. A circunstância foge do controle de ambos, quando ela é convidada a trabalhar em Madri. O sonho deles era que o mundo se acabasse, e eles fossem morar em um local bem longe de Toledo e do controle familiar, já que ele trabalhava para seu pai como vendedor Sentindo-se inferiorizado pela proposta da mulher de se mudarem para Madri, a fim de começarem uma nova vida, parte para a agressão verbal e coação. Não cedendo a seus apelos, Antonio tenta suicídio em sua presença, cortando-se com uma faca de cozinha. Levado ao hospital ele está bem, pois fora um corte superficial. Agora as duas irmãs voltam a estar unidas e Pilar, escoltada por duas amigas, entra em sua casa para fazer suas malas e pegar apenas dois enfeites que gostava muito: um prato e uma foto dela e seu pequeno Juan. Todo o resto fica com seu ex-marido. Com Juan cuidado por Ana e o marido, Pilar parte para seu novo destino. Voltaria para pegar o filho!

Sobre o filme.
Pelos Meus Olhos chega cinco anos depois, tendo arrebatado sete prêmios Goya e tornado-se referência sobre a agressão doméstica contra a mulher. Icíar Bollaín considera a violência contra a mulher um problema universal, não ocorrendo somente em países latinos. Ambienta o filme em Toledo, por julgá-la uma cidade de grande plasticidade e cercada de muros, que ajudam alcançar a sensação de claustrofobia desejada. O roteiro foi escrito em dois meses e a filmagem em outros dois. No grupo terapêutico, apenas o terapeuta e o marido reabilitado são atores, os outros são pessoas que realmente fazem parte do grupo. “Construir essas cenas e tornar verdadeiros esses homens, não apenas caricaturas, foi um das etapas mais gratificantes do processo de criação do filme” diz a diretora. A adequação dessas mulheres aos papéis é muito real e suas reações, dependendo de suas idades, precisas. Vale a pena ser conferido!

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