segunda-feira, 28 de julho de 2008

Era uma Vez de Breno Silveira


de Breno Silveira
Um morro carioca, a favela do Canta Galo. Um grupo de crianças joga futebol em um exíguo espaço entre os barracos. Beto é um excelente jogador, deixando a torcida enlouquecida por seus gols. Ele está acompanhado do irmão caçula, Dé de 8 anos, que o venera. Após diversos passes sensacionais a torcida contra, pertencente ao chefe do morro, resolve alterar o resultado do jogo espancando o menino até a morte. Carlão, o irmão mais velho, interfere na briga, mas já é tarde demais. A mãe dos garotos, Bernadete, se desespera e pede para que ele desapareça de lá, pois seria morto. O rapaz perambula pelas praias de Ipanema sem destino, dormindo em caixas de papelão. Encontrado pelo pequeno Dé, o dissuade de usar a arma que pegara em uma loja da favela. O filme salta dez anos e o adolescente Dé (excelente Thiago Martins) trabalha em um quiosque na orla da praia vendendo cachorro quente. Está perdidamente apaixonado por uma garota que mora na avenida em frente ao seu trabalho. Ele a observa o tempo todo, sabendo que nunca será notado, pela diferença de classes sociais que os afastam. Retrocedemos dez anos e Carlão diz a seu irmãozinho que matar não é correto, são pessoas honestas e irão encontrar uma saída para a situação humilhante em que se encontram. Contudo uma blitz da polícia o prende por estar portando uma arma. De volta ao presente, vemos sua amada Nina (Vitória Frate) terminando o namoro e desesperada atravessa a rua, deixando sua bolsa solta no banco. Um grupo de garotos do morro aproxima-se, mas o rapaz vai a seu encontro, levando-a para casa. Esse é o primeiro encontro entre eles. Depois de algumas passagens em que tenta se insinuar para a menina, sem sucesso, finalmente tem a oportunidade de se sentar ao seu lado, durante uma festa na praia, passando-se por um menino rico. Desmascarado por um surfista, que diz ser seu amigo, mas que está corroído de ciúmes, o jovem parte sentindo-se muito humilhado. Com carinho e cuidado, começa um namoro arriscado, apesar do medo inicial de nossa heroína, que é encorajada pela melhor amiga. Com o passar do tempo eles se tornam verdadeiramente apaixonados, mas o abismo é brutal. Moram a alguns metros de distância, entretanto a maior barreira é social, somando-se a preocupação da mãe de Dé, que fora abandonada pelo marido e do pai de Nina, viúvo, que não acreditam que isso possa prosseguir sem graves acidentes. Bernadete pede para que ela não suba mais o morro, embalado ao som do funk e crimes, e o pai de Nina, empresário, argumenta que namoro, só no apartamento deles. Consentirá com a situação, por amor a sua filha, contanto que Nina não minta e não se envolva com os outros habitantes da favela. Numa conversa franca com seu namorado, afirma que começou do zero e que dará uma chance ao jovem que é honesto e trabalhador. Dé, um dia, é surpreendido na praia por seu irmão Carlão (ótimo Rocco Pitanga), que fugira da prisão, pois iria morrer se lá permanecesse. Dé chora com as más notícias, mas acaba compreendendo o ponto de vista de Carlão que descreve o presídio como “uma selva em que bicho come bicho todos os dias” e ele próprio acabara de matar um bandido para não morrer. Contrafeito o garoto pede que ele vá para casa e fique com a mãe, mas é contrariado, pois seu irmão havia achado um “cafufo” para esconder-se e só subiria o morro a fim de matar o assassino do irmão. O que advém para desesperança da família e ainda pega a corrente de ouro do jovem morto, na qual estava pendurada uma bala. Agora com a corrente no pescoço, um santo é o seu amuleto. Exatamente isso, Carlão se tornara um marginal. Após dez anos de cadeia, essa era a única coisa que poderia fazer - trabalhar normalmente está fora de cogitação, tendo a polícia em seu encalço. Substituiria “Café Frio”. Presentemente é o principal membro de sua milícia armada até os dentes, no tráfico de drogas. É o dono do morro. Dé é constantemente confrontado com a desigualdade social entre ele e a sociedade em que sua namorada vive, sentindo seu orgulho ferido, pois acredita que ser pobre não é nenhum problema contanto que se seja honesto. Resolvendo fugir, pelo perigo apresentado em algumas ocasiões, o casal planeja morar em qualquer praia do nordeste e abrir um pequeno negócio, pois o pai de Nina quer levá-la para viver na Europa, já que nada o prende no Brasil. O jovem procura sua namorada, com as passagens já compradas. Felizes, como só os adolescentes sabem ser, decidem o dia da fuga e Dé pede conselhos ao irmão sobre como proceder. Encantado com o insólito casamento com a princesa, oferece-lhes como presente um punhado de notas e uma grande festa de casamento. No entanto, seu chefe no tráfico de drogas vem cobrar sua parte nos negócios, mas como o dinheiro fora dado ao seu irmão, tendo o prazo de dois dias para efetuar o pagamento. A situação piora muito porque é também achacado pela polícia, que de maneira selvagem, reenvidica sua parte para fechar os olhos. Apesar de pressionado por todos os lados, a festa se realiza com muita cerveja, churrasquinhos, e um enorme bolo de noiva. Nina volta para casa e Dé continua na festa, junto à sua família. A grande oportunidade será na tarde do dia seguinte, quando ela e seu pai viajariam para a Europa. Atrasados, o empresário abre a porta do quarto da filha, mas está vazio. Ao mesmo tempo o telefone toca e ele se desespera: Nina fora seqüestrada e esperam o resgate. Sua amiga vai procurá-la na casa de Dé, mas o garoto também não conhece seu paradeiro. A essa altura, pensamos que Carlão é o seqüestrador. O rapaz, apavorado, vai procurar o irmão, exigindo saber onde sua amada está. Desconfiado invade um cômodo, onde ela se encontra amordaçada. Atormentado, Dé arrebata Nina do cativeiro, desentendo-se com seu irmão e, agora, tirando-lhe a arma, aponta-a em sua direção, começando uma violenta discussão sobre o bem e o mal; entretanto sem saída decide dispará-la, acertando Carlão. Apesar de mortalmente ferido, os protege para que saiam ilesos do morro. Contudo o pai de Nina havia chamado um jornal e a polícia, incriminado Dé pelo seqüestro. Acuados os jovens refugiam-se no quiosque, porém a polícia, os pais e toda a mídia encontram-se no local. Isso impossibilita a evasão deles e após cinco horas de martírio eles decidem sair. Fingindo seqüestrá-la, mantem o revolver na sua cabeça. Ela na frente para protegê-lo e seu amor atrás! Na hora em que ela se afasta um pouco para falar com o pai, Dé é atingido por uma bala, matando-o na hora. Caído ensangüentado na areia a jovem Julieta ao ver seu Romeo morto atira em direção aos policiais e é assassinada no mesmo instante. A câmera fecha mostrando o corpo dos jovens amantes, um sobre o outro, mortos na areia da praia.
Durante os créditos vemos Thiago Martins dando um depoimento, no qual ele afirma morar na favela do Canta Galo e que a história é velha conhecida dele, mas a cidade do Rio de Janeiro precisa mudar e que para isso aconteça depende das pessoas “passarem a olhar mais uma para as outras”.




A miséria e brutalidade deste filme, algumas vezes, são mostradas de maneira abrandada, pois o que interessa ao diretor é acentuar os desejos e sonhos dos jovens, os quais lhes parecem sempre viáveis e possíveis, independentemente da classe social. Breno consegue seu objetivo indo fundo à alma dos personagens. O elenco interpreta muito bem seus papéis, a direção é segura, a fotografia é ótima. Os belos sambas de Marisa Monte e Luiz Melodia complementam esse filme que merece ser visto.

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